Você conhece alguém num aplicativo de namoro e tudo parece um mar de rosas: a pessoa é apaixonante, cativante, carinhosa, tece declarações de amor. No meio do caminho, no entanto, ela começa a dar ghosting, para de responder e depois reaparece do nada, pede dinheiro emprestado, o número do seu CPF ou seus dados bancários. Esses são só alguns sinais de que você pode ser vítima de um estelionato ou abuso emocional, famosos golpes do Tinder.
Essas práticas acontecem não só nos apps, como mostra O golpista do Tinder, filme da Netflix, no mundo “real”. A psicanalista Andréa Ladislau ressalta, contudo, que nem sempre os sinais de alerta são tão visíveis. “É preciso estar atento aos detalhes e não acreditar em tudo que se diz, principalmente se você conhece a pessoa há pouco tempo”, alerta. Andréa explica que a armadilha do estelionatário emocional é justamente ganhar a confiança da vítima, usando palavras de acolhimento para preencher uma carência afetiva. “A grande saída é ouvir, analisar e observar mais em vez de se expor, falar muito e entregar suas inseguranças”, acrescenta.
Andréa e outras especialistas ouvidas por CLAUDIA explicam que as mulheres geralmente são o alvo preferido desses golpes por serem socializadas desde a infância para ter relacionamentos, encontrar um “príncipe encantado” ou a “tampa da panela”. Elas contam que os falsários geralmente são exagerados em cuidados, fazem um excesso de perguntas especulativas e mantêm uma aura de mistério sobre a própria vida. Também são mestres em ausências estratégicas, para chamar a atenção da vítima. Aqui estão algumas dicas para não cair na lábia dos golpistas do Tinder (e de quaisquer outros apps).
Dinheiro, não
A começar pelo mais básico, não se deve passar informações pessoais sensíveis (como número do CPF) ou financeiras para um estranho, por mais apaixonada que se esteja e por mais rica que a pessoa pareça ser —como mostra o filme da Netflix, é comum que estelionatários se vangloriem de ter muitas posses. “Aquela frase ‘quando a esmola é grande o santo desconfia’ é real, desconfie quando a situação parece muito boa para ser verdade”, diz a psicóloga Vanessa Gebrim. “Se um conhecido te manda mensagem e diz que está precisando de dinheiro naquele momento, por mais que você confie na pessoa e queira ajudar, investigue se aquele contato é verdadeiro. Ligue para o número, tente uma chamada de vídeo ou faça perguntas para saber se a pessoa conseguirá te responder. Isso também ajuda”, orienta.
No vasto rol de golpes, Vanessa cita outros exemplos de estelionato, como quando o criminoso ou criminosa se passa por estrangeiro e diz que quer enviar um presente. Um tempo depois, essa pessoa se passa por funcionária de uma empresa de correio e diz que tal presente está preso na alfândega, solicitando um valor financeiro para liberação.
Para André Ladislau, a conversa sobre dinheiro sequer deve existir quando se está conhecendo alguém online. “Em hipótese alguma exponha seus ganhos financeiros ou mesmo deixe claro seu patrimônio. Não ceda a pedidos de dinheiro ou bens materiais, carregados de vitimismos e promessas de solução ou devolução imediata. No início, os pedidos são poucos, mas logo aumentam”, alerta.
Cuidado com o love bombing
Conforme explica a advogada Mayra Cardozo, especialista em direitos humanos, penal e stalking, os golpistas são constantes, mandam mensagens a todo instante, enviam flores e outros mimos. “Eles fazem um love bombing até que a vítima esteja apaixonada e tenha certeza que encontrou a pessoa ideal. O abusador geralmente diz morar longe, deixando o sonho de um eventual encontro, algum dia indefinido, mais uma estratégia de distanciamento pessoal para que se mantenha a idealização”, detalha.
Segundo Mayra, essa bomba de amor, muito rápida e intensa, está muito presente nos golpes do Tinder e é o primeiro passo para que surjam as manobras financeiras. Muitas vezes, o golpista propõe uma viagem a dois e pede o cartão de crédito da vítima, por exemplo. “Sempre há desculpas elaboradas num jogo de manipulação até que a vítima ceda. Quando há maiores resistências, eles ameaçam terminar o relacionamento virtual, porque estão ‘chateados’ porque a vítima ‘não confia neles.'” Se conseguem o que querem, os falsários ficam com o dinheiro, bloqueiam a vítima e desaparecem.
Busque referências pessoais
Mayra também recomenda sempre verificar o perfil da pessoa, jogar as fotos no Google, procurar rastros profissionais, antecedentes criminais e buscar amigos em comum. “Faça perguntas sobre a vida dessa pessoa e verifique se existe coerência em suas narrativas“, orienta. Para minimizar os riscos, segundo ela, o ideal é optar por relacionamentos virtuais nos quais existam pessoas em comum, que possam dar referências do possível date.
“Sempre tente encontrar a pessoa pessoalmente em local público para confirmar que ela é quem diz”, acrescenta Vanessa Gerbim, lembrando de outro ditado que diz que é melhor prevenir do que remediar.