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Trilha de Cuidado

Como transformar uma relação de admiração em amizade e parceria profissional? Karina e Gabi conseguiram seguindo juntas os caminhos do autoamor

Por Karina Vieira em depoimento a Sarah Catherine Seles
11 nov 2022, 09h26
"Entendemos que a nossa negritude está para além do sofrimento que as outras pessoas poderiam nos causar por sermos quem somos", conta Karina Vieira.
"Entendemos que a nossa negritude está para além do sofrimento que as outras pessoas poderiam nos causar por sermos quem somos", conta Karina Vieira. (Ilustrações/Getty Images)
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Em 2009, eu participava de um coletivo de mulheres negras, o Meninas Black Power, que tinha sede no Rio de Janeiro e era composto por meninas de todo o Brasil. Nós começamos a fazer um evento anual com palestras, shows, feira de empreendedores pretos e oficinas. Em uma das edições, sediada na Fiocruz, a Gabi Oliveira foi uma das palestrantes. Eu já a conhecia pelo canal no YouTube, por acompanhar seu trabalho. Mas a partir daquele encontro, a gente ficou mais amiga, mais íntima. Começamos a conversar durante o evento e, desde então, não nos soltamos mais.

Nossa relação foi se estreitando ao longo dos anos, nos tornamos companheiras de shows, com conversas noites a fio, compartilhando sonhos e desejos. Em uma dessas trocas, comentei com ela sobre a possibilidade de fazer um podcast e que teria que ser com outra mulher negra. Na hora, ela disse que também tinha planos de começar um podcast e falamos ‘Vamos fazer juntas!’. 

Começamos a pensar sobre qual seria o fio condutor do programa, não queríamos falar apenas sobre racismo, porque entendemos que a nossa negritude está para além do sofrimento que as outras pessoas poderiam nos causar por sermos quem somos.

Em 2019, tinha muita gente fazendo podcast, mas não tinha, pelo menos, no nosso radar, nenhum podcast que falasse das coisas que a gente queria ouvir: a subjetividade dos seres humanos e a pluralidade dos corpos negros. E foi nesse mote que a gente começou a fazer o primeiro episódio. Eu estava muito insegura para gravar e a Gabi me encorajou: ‘Porque não falamos, então, exatamente sobre insegurança? Esse projeto é pensado para falarmos exatamente sobre nossos sentimentos e angústias’. Depois de entender o caminho que queríamos trilhar, decidimos que o nome seria Afetos, já que abraçam os sentimentos ‘positivos’ e aqueles considerados ‘negativos’, mas que nos movem de alguma forma.

Lançamos sem nome, sem nada. E, a partir de 2 de junho de 2019, o Afetos entrou no ar em todas as plataformas de podcast no país. Quando lançamos o primeiro programa, tivemos uma ótima receptividade tanto do público quanto dos nossos amigos que já sabiam e nos apoiavam.

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Eu e a Gabi temos vivências muito diversas. Nós temos histórias familiares pouco similares, experiências acadêmicas diferentes, vivências amorosas muito distantes e acho que é isso que enriquece o encontro. Nosso desejo ao fazer esse projeto é dialogar e mostrar a pluralidade dos corpos negros, que podemos pensar de maneiras diferentes, discordar e somar, sem deixar de ter uma troca saudável.

Nos aproximamos depois do programa, além de ser um trabalho que a gente gosta muito de fazer. Temos que estar em contato frequente para colocar os episódios no ar toda semana. O que tenho com a Gabi atravessou os muros de uma relação de amizade e se transformou numa parceria profissional, que agora se materializou no livro Cartografia dos Afetos: Uma conversa sobre vivências, descobertas e os caminhos do autoamor (Companhia das Letras).

E afeto também é a palavra que define as ouvintes do programa, que compartilham suas vivências e encontram um espaço aberto ali. É um retorno muito íntimo, a gente fala de temas que são muito caros para algumas pessoas, especialmente para mulheres pretas.

Para mim e para a Gabi, é muito incrível receber relatos e esse carinho, porque elas acreditam e sentem na gente um acolhimento que, de outra forma, elas não teriam. Muitas comentam que se sentem como nossas amigas, que quando nos escutam, parece que estão ao redor de uma mesa. São essas conversas íntimas que queremos.”

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