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Por que os dreads são importantes para o movimento negro? E como cuidar?

Conheça a história e os métodos para se obter dreadlocks – um penteado de origem e simbologia ancestral

Por Barbara Poerner
15 Maio 2024, 10h00
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  • Danielle Onawale sempre adorou mudar os cabelos. Já teve os fios curtos, longos, coloridos e trançados. Há três anos, resolveu adotar os dreadlocks — e se encontrou verdadeiramente.

    “Houve um ano em que troquei de cabelo dezoito vezes, e eu não me senti tão contemplada quanto agora”, diz. Por isso, resolveu fazer da paixão algo rentável e fundou o salão Sete Fios, especializado em dreadlocks, na cidade de Salvador, na Bahia.

    “Transformei uma coisa que eu gosto de fazer em algo que me nutre, tanto internamente quanto financeiramente”, conta a trancista especializada em locks, como são chamados.

    O que são os dreadlocks?

    Os dreadlocks são um tipo de entrelaçamento dos fios que cria mechas permanentes e visíveis no cabelo. Há duas técnicas predominantes para obter o visual (o agulhamento e o cultivo), cada uma delas com um manejo, tempo e cuidado próprios — mas já iremos às dicas práticas. 

    Sua origem é milenar. “Um dos registros históricos mais antigos de seu uso está nos sacerdotes de uma religião etíope de 500 a.C. Na Índia, há registros de 1800 a.C. Há também evidências de uso nos antigos egípcios e nos indígenas Abya Yala, da Serra Nevada, no norte da Colômbia”, explica Layla Maryzandra, trancista e presidente da Associação Nacional de Trancistas Negras) e especialista em História e Cultura Africana e Afrobrasileira.

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    Qual é a origem dos dreadlocks?

    Layla pesquisa a iconografia de penteados tradicionais africanos, relacionando identidade e território. “Embora os dreadlocks estejam presentes em diferentes culturas antigas, é na origem africana e na diáspora negra que seu uso se torna popular e estigmatizado ao longo da história”, continua a pesquisadora, que também é ativista do movimento negro.

    Um dos países que mais colaborou com a popularização dos locks e os colocou no imaginário geral é a Jamaica. A pequena ilha caribenha e, mais especificamente, Bob Marley costumam ser associados ao penteado.

    O vínculo do famoso cantor de reggae com os dreadlocks que usou por toda a vida parte do Rastafarianismo: um movimento religioso e filosófico que surgiu em meados do século XX, e que enxerga uma figura messiânica em Haile Selassie, o primeiro imperador negro a governar um país africano, a Etiópia.

    Dreadlock tem origem milenar
    Dreadlocks elevam a autoestima de muitas pessoas (Julia Jabur/CLAUDIA)

    Os dreadlocks estão associados à espiritualidade?

    A pesquisadora relaciona o cabelo com a espiritualidade, já que “em certas práticas espirituais e religiosas, os dreadlocks podem simbolizar devoção e compromisso com um modo de vida específico”.

    No Rastafarianismo, por exemplo, o crescimento orgânico dos cabelos é um preceito religioso. Ou seja, não cortar os dreadlocks seria como um tributo ao messias e uma aproximação à sua ancestralidade africana. “Os dreadlocks são cuidados como uma planta, e isso também está ligado a uma prática espiritual de cuidado com o seu corpo”, diz Layla.  

    Como são feitos os dreadlocks?

    Vamos à parte prática. Hoje em dia, a forma mais popular de obtenção de dreadlocks é feita com agulhas, no chamado agulhamento, explica Danielle: “São locks instantâneos. A pessoa chega com o cabelo virgem, e em algumas horas já sai com ele pronto, com a aparência de locks maduros”.

    Geralmente, quem deseja mudar rapidamente procura essa alternativa, que pode ser feita em salões ou com trancistas especializados.

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    Já o cultivo é um processo mais longo e custoso. “Chamamos assim porque, se olharmos, o cultivo de um lock natural sem agulha se parece com o ato de plantar uma muda, uma semente. É preciso esperar que brote, cresça, amadureça. Alguns locks podem se perder no processo, como se folhas estivessem caindo, se renovando. É algo muito natural”, diz Danielle. 

    Para isso, a técnica é chamada de ‘dedoliss’ ou ‘torção’, e consiste no cruzamento circular de duas mechas com as mãos, o que faz o cabelo se embaraçar naturalmente, sem produtos. O procedimento pode ser feito em casa, mas exige destreza e conhecimento. Existe também o cultivo com tranças, no qual o cabelo é trançado sem fibras ou produtos químicos.

    A diferença entre as técnicas, define Danielle, é a paciência. “Se você pretende fazer um cultivo sem agulhamento, você tem que entrar em uma jornada e entender que vai passar pela fase do frizz, que ele é importante.

    Então, é necessário que a pessoa tenha uma relação de desapego com a perfeição do cacho, do crespo, porque vai haver um momento em que o cabelo vai criar o próprio movimento. Ele amadurece no tempo dele.”

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    Dreadlocks naturais ou sintéticos: qual escolher?

    Optar entre o cabelo natural e o sintético varia de acordo com as necessidades do cliente. “Para quem gosta de pintar e de descolorir, o ideal é que a extensão seja feita com cabelo natural. Se é uma pessoa que não curte tanto essas transformações, o sintético é a melhor opção.” Para colorir os dreadlocks, diz Danielle, o processo exige atenção para que o interior do cabelo também absorva a tintura. 

    Se você deseja fazer o penteado de forma natural, Danielle explica que quanto mais crespo o cabelo, menor a necessidade de que ele seja muito comprido — com 5 ou 8 centímetros já é possível iniciar o processo de cultivo, afirma a especialista. Em outros tipos de cabelo, como os lisos ou cacheados, o comprimento precisa ser mais longo, de 10 a 15 centímetros. Se a opção for com as agulhas, é possível iniciar o dreadlock com aproximadamente 2 centímetros, independentemente do tipo de fio.

    Como cuidar dos dreadlocks?

    No dia a dia, é melhor evitar produtos pastosos, como cremes de pentear e mousses, pois eles podem ficar presos dentro dos fios, dificultando sua remoção ou causando até fungos.

    Para Danielle, enxaguar em abundância, usar tônicos semanalmente, hidratar a raiz e permitir a plena secagem dos fios são as dicas principais.

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    Quanto à manutenção, que é basicamente uma forma de apertar os dreadlocks, a periodicidade varia de acordo com o tipo de cabelo e desejo do cliente. Em seu salão, Danielle recomenda até seis manutenções anuais: “Meus locks já estão maduros há três anos, então quatro manutenções anuais são suficiente”.

    Dreadlock história e estereótipos
    Dreadlock é penteado com origem e simbologia ancestral (Julia Jabur/CLAUDIA)

    Desfazendo mitos e estereótipos ligados aos dreadlocks

    Ainda existem muitos mitos sobre o uso dos dreadlocks, mas Danielle reforça que todo cabelo precisa ser cuidado e hidratado. Além disso, é possível desembaraçar os locks e recuperar até 80% de como os fios eram antes do cultivo, sem precisar cortá-los na raiz — outra crença bem comum. 

    Segundo a especialista, os estereótipos e o racismo que envolvem o penteado aumentam, “principalmente, se ele estiver na cabeça de uma pessoa preta. Tudo que nós criamos e vestimos está sujeito a isso”. Contudo, Danielle acredita que, assim como aconteceu com as tranças há alguns anos, os dreadlocks estão sendo normalizados. 

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    Sua esperança é que, em poucos anos, o preconceito diminua. Para ela, a maioria dos seus clientes encontra um lugar de pertencimento a partir do penteado.

    Embora as motivações para aderir aos locks possam ser diversas, o que Layla defende é que “a prática seja um saber ancestral, herdado para cuidar e honrar nossa cultura. Não é sobre tendência e modismo. Estamos falando de modos de vida que precisam de valorização e respeito”, finaliza.

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