Respira grande. Segura. Espera. Solta devagar. Escuto essas palavras enquanto sentada, com as pernas cruzadas e os pés em oposição às coxas, para iniciar uma prática de Ishta Yoga. Esse estilo combina diferentes ensinamentos, antigos e contemporâneos, numa soma de Hatha, Tantra e Ayurveda. Acredito que alguns deles farão a minha mente se aquietar naquele dia, nem que seja um tiquinho.
Lá fora (da minha mente), os barulhos são poucos: dos passarinhos no jardim, da janela se movimentando com o vento, do mantra entoado pela caixinha de som. Já do lado de dentro, pelo contrário, quanto barulho! Inúmeros, um atropelando o outro. Ainda na posição de lótus, do nada, a voz do meu consultor de investimento faz coro a essa confusão silenciosa.
Em reunião, no dia anterior, ele havia dito e repetido, no início e ao final da videochamada corrida que tivemos no meio da agenda de trabalho: “Respira, espera, confia, lá na frente vai dar certo”. Meus investimentos, com os quais eu conto para me aposentar um dia sem passar sufoco, renderam zero qualquer coisa no mês anterior.
A fantasia de não ter a necessidade de trabalhar até os meus últimos dias de vida parece, naquele momento, ser uma ingênua esperança de dias melhores.
Me esforço para concentrar. Enquanto alongar é um descanso para a maioria, para mim é um sacrifício. Chego a suar mais com yoga do que com musculação, que há pouco resolvi retomar. É que uma dengue forte, que me jogou na cama por uns dias, diluiu os meus músculos. Como disse um amigo, sem receio de me traumatizar, “minha perna virou um carpaccio”. Me visualizei fugindo de um mosh no show do Megadeth, que abriu o show do Black Sabbath, no Mineirão, em 2013.
Sigo na árdua tarefa de me concentrar durante a adho mukha svanasana. Não foi erro de ortografia, esse é o nome da “posição do cachorro”, que alonga as pernas e alivia a dor das costas (para o bem da minha lombar!).
Dele, passo para a bhujangasana, ou seja, a “pose da cobra”. Faço tudo isso de olhos fechados. Resolvo abri-los rapidinho e fixo o olhar na minha vizinha de tapete. Uma bela mulher 60+ segura uma caturangadandásana, ou melhor, se firma em quatro apoios, mãos e pés, para uma prancha que passa de minutos. Eu caio e levanto algumas vezes enquanto ela segue firme. Uma exímia iogue.
Silêncio! Uma pergunta em placa neon ofusca todo o resto, desta vez não sei quem disse, mas imagino que tenha sido a minha própria voz, que chegou chegando, distribuindo purpurinas ao léu: o que adianta dinheiro no futuro se eu não tiver mente quieta e corpo são? A palavra “espera” nunca fez tanto sentido para mim.
Agora, a minha parte preferida do yoga, até então: shavasana, a “postura do cádaver”, assim chamada porque, quando praticada, busca-se um relaxamento total do corpo e da mente. O filme em preto e branco A Estação (de Cristina Maure, com Jimena Castiglioni, Rodolfo Vaz e Eid Ribeiro), que assisti há quase dois meses na tela do cinema, vem para reforçar.
A provocativa película conta a história de Sofia, uma mulher reservada que caminha até a isolada Estação Vila Clemência com a intenção de pegar um trem para encontrar o marido, que a abandonou para ficar com outra. Mas esse trem não vem.
Longe de tudo e de todos, ela é obrigada a se hospedar na pensão oferecida aos passageiros da Companhia Ferroviária Nacional. Eles chegam, não mais saem, todos à espera de um trem que não tem data para passar. Com planos longos e fixos, o tempo incomoda.
A arte não dá respostas, ela joga luz sobre algum ponto que mexe com você. No meu caso, a espera. Faça atividades físicas, junte algum dinheiro, espere. Namastê.
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