Há uma generalização de que o universo Marvel anda numa fase em baixa e que isso tem a ver com essa fase mais pesada de luto, com personagens lidando com trauma. É também uma fase com a geração mais jovem e diversificada, uma parte interessante da franquia. Seja como for, Eco é um dos melhores conteúdos desse momento, disponível na Star+.
A série é a continuação imediata de Gavião Arqueiro, com Maya Lopez (Alaqua Cox), uma garota Choctaw surda, órfã de mãe e pai, cujo chefão do crime – Kingpin (Vincent D’Onofrio) – a tem como filha adotiva.
Por conta de seu talento, ela é uma executora mortal do submundo, usando o codinome de Eco, mas, ao descobrir que Kingpin a traiu (ele mandou matar o pai dela), Maya volta para Oklahoma e a família que ela não vê há anos para resolver todas as pendências e se encontrar.
Em cinco episódios, ela lida com o passado para tentar definir seu futuro, equilibrando ação e drama com inteligência e humor. As relações mais profundas são comoventes, mesmo que rápidas, e a ensinam a canalizar a energia mística do Choctaw através de suas mãos. Aqui entendemos o seu codinome, Eco, uma referência tardia de como ela “ecoa” seus ancestrais.
O fato de que a narrativa incorpora as barreiras físicas da atriz Alaqua Cox, que cresceu na reserva da Tribo Menominee, e é surda, além de ter uma prótese na perna como a personagem, é um detalhe à parte.
Há um arco de recuperação e contextualização que fazem dessa série em particular um dos destaques da Marvel. É sensível sem explorar heroísmo. Sei que muitos reclamaram, mas achei emocionante vê-la com maior profundidade, nem todos tiveram a mesma oportunidade. E no papo com Alaqua, entedemos ainda mais a importância.
CLAUDIA: Eco é um spin off de Gavião Arqueiro, com uma ligação também com Daredevil, mas é ainda mais do que isso. Na sua opinião, sobre o que é a série?
Alaqua: É na verdade sobre uma heroína indígena surda em busca do que define comunidade e família. Ela estava em Nova York com Kingpin quando o caos acontece [o que acontece em Gavião Arqueiro] e ela decide deixar tudo e voltar para Oklahoma, onde estão suas raízes. O problema é que ela tem dificuldades em se abrir com sua família por causa do trauma de quando era menina.
CLAUDIA: Mas não é apenas drama, tem muita luta e ação, né?
Alaqua: Sim, é aventura, com muitas lutas, e intensa. Tem ênfase nas comunidades indígenas e humor também dessa comunidade, além de trazer a perspectivas dos surdos.
CLAUDIA: Como você definiria quem é Maya Lopez?
Alaqua: Ela é complicada, cheia de emoções e muita raiva, porque Kingpin mandou matar seu pai [também parte da trama de Gavião Arqueiro). Ela o tinha como sua família adotiva, e quando descobre a verdade suas emoções ficam ainda mais caóticas, quer vingança até porque nem teve tempo para processar o luto pela morte de seu pai. Quando chega em Oklahoma, tenta se reconectar com sua família biológica, numa teia muito complicada que tem que ir se inserindo.
CLAUDIA: Um processo doloroso, né?
Alaqua: Sim porque ela é autocentrada e é difícil interpretá-la, mas me diverti fazendo Maya, foi uma boa jornada.
CLAUDIA: Você se identifica com ela em mais aspectos [Alaqua também é surda e de origem indígena]?
Alaqua: Na verdade, em quase nada [risos]. Tive que analisá-la muito para entendê-la. Nossa identidade mútua tem a ver com o mesmo trauma infantil [onde perderam uma parte da perna], mas o meu trauma não é nem de perto doloroso como o dela. Ela cresceu com um pai e um tio criminosos e eu passei por várias cirurgias por toda minha infância por causa da minha perna protética. Nenhuma criança deveria passar por isso, mas sim, essa é a parte onde eu e Maya vivemos a mesma coisa.
CLAUDIA: E a relação de Maya com Wilson Fisk, o Kingpin [e antagonista da série]?
Alaqua: No passado, era uma relação de amor e ele queria que ela herdasse todo seu império. Ele a amava tanto assim. Eles se davam muito bem e ela cresceu achando que tudo era normal [a violência, o crime] e agora que cresceu começa a perceber que é tudo menos normal, especialmente depois que seu pai morreu e ela viu que a vida não precisava ser assim. Por isso, ela tenta se afastar de Kingpin e escolhe se reconectar com sua família de verdade, embora todo o processo demande muito trabalho. Mas ela está chegando lá, por isso é uma história interessante.
CLAUDIA: Como foi a preparação e como foi para manter a autenticidade cultural em Eco?
Alaqua: Quisemos ser o mais precisos possível e isso inclui os figurinos, o que está na sua armadura de Eco. Tem formatos de diamantes, do Sol, que têm sentidos muito específicos para a tribo também. É muito importante para Maya representá-los.
CLAUDIA: A parte física foi mais fácil?
Alaqua: Sim, porque eu sempre fui atlética, mas tive treinamento específico com um personal trainer para as lutas. Não foi difícil porque sempre treinei e gosto de ação física, mas ainda assim eram cinco dias por semana e três horas por dia para meu treino pessoal e aprender as lutas, mas isso ajudou muito para o papel.
CLAUDIA: E trabalhar com o elenco e equipe de produção, como foi?
Alaqua: Eles todos aprenderam a linguagem de sinais com um professor que também era surdo, então foi incrível que a Marvel tenha dado essa oportunidade de inclusão, é muito importante para todos e há pessoas com deficiência auditiva na equipe, atrás das câmeras também, e foi muito bom me ver representada.