Quem acompanha minhas colunas e matérias, sabe que tenho uma paixão pelo universo da Disney que obviamente foi plantado na minha infância. A mágica, a positividade e mensagens de esperança sempre fizeram parte da tônica. Com o tempo, atualizações e revisões foram feitas e é incrível que a Disney tenha abraçado um universo realista com toques de mágica, seja com uma protagonista feminina independente e se corrigindo pela falta de diversidade. Pode parecer pouco, mas não é.
Por muito tempo, os excluídos aprenderam a usar ainda mais a imaginação, pois nenhuma das heroínas se encaixava nem nosso biotipo ou cultura, mas ainda assim as amávamos. Veio Mulan, veio Pocahontas, veio Tiana (amo!!!!), mas até agora não tínhamos visto ainda uma personagem latina protagonizando um desenho da Disney. Com “Encanto”, isso mudou através de Mirabel.
Tudo bem, para nós, brasileiros, talvez o desenho da Pixar, “Rio”, fale mais diretamente com a gente. Porém, “Encanto”, que retrata muito a cultura colombiana, tem a ver com a gente também. Da mesma equipe que trouxe “Moana”, com a participação de Lin Manuel-Miranda, o filme acompanha a história da família Madrigal, que vivem em um lugar escondido nas montanhas chamado Encanto.
Todos os membros da família Madrigal tem um dom, seja cura, poder de mudar as coisas de lugar, ou até ter visão do futuro, menos a doce Mirabel. Em um universo onde a magia é comum, ser diferente não é o que a jovem gostaria, mas quando o universo de Encanto entra em risco, apenas Mirabel pode salvá-los.
Conversei exclusivamente com a atriz Angie Cepeda, que interpreta Julieta, a mãe de Mirabel em “Encanto”. Falamos do misticismo latino, das mudanças mundiais e, claro, mágica.
Como você entrou para o projeto “Encanto? É tão bom ver a cultura latina em um desenho da Disney!
Eu tive que fazer um teste! E tive que cantar uma música que eu mesma tinha que escolher e me pareceu tão aleatório, mas resolvi arriscar e fiz o teste, honestamente não esperando ser chamada. Mas os diretores quiseram me conhecer, conversamos e fiz outro teste e aí me contrataram. Mas foi super rápido (risos), acharam que a minha voz era o que queriam para Julieta [a mãe de Mirabel], assim como a minha personalidade e assim me envolvi com o projeto.
E como foi – como atriz – trabalhar em uma animação? Porque você grava tudo em uma cabine sozinha e nós só vemos a mágica da tela.
Foi super divertido, para começar, os diretores foram muito legais, aliás, todos os envolvidos no filme e isso é muito importante. Me fizeram sentir confortável desde o início, o que me deu a liberdade de ser criativa, de ser eu mesma e inventar muitas coisas porque é exatamente o que você faz. O diretor fala com você, pede para refazer a cena de novo e de novo e de novo tentando coisas diferentes e isso durou alguns meses. E foi muito bom! Tive uma sensação de muita liberdade, algo novo, diferente, eu nunca senti antes a mesma coisa. Quando você está na frente de uma câmera, você está ciente e consciente de si mesmo, mas quando é apenas a sua voz não importa a sua aparência, foi divertido. Adoraria fazer de novo! (risos)
E quando viu o filme, reconheceu suas expressões e gestos em Julieta?
Sim porque tem uma câmera registrando o processo de gravação de voz, e, pelo que entendi, essas imagens são usadas para captarem suas expressões para os artistas que estão fazendo a animação – não sei dizer isso em inglês! (risos) Mas sabe que isso faz do processo ainda mais especial. Quando vi a primeira versão do filme eu fiquei, uau! Isso é insano! E também me sentir tão próxima dos outros personagens, porque eu nunca os encontrei! Só os conheci hoje, na coletiva para a imprensa! Mas você no filme o amor que eles sentem um pelo outro, a mãe, a filha, são tão coladas e… nós nunca nos encontramos antes! Stephanie e eu só nos encontramos hoje!
Na cultura latina em geral há sempre um elemento de magia e que está na história. Como foi para você, como uma mulher latina crescer nesse universo?
Eu venho de uma família enorme e muito unida. Quando eu era pequena, minha avó morava nessa grande casa que me parecia tão misteriosa. Eu tinha medo, ouvia coisas, era mágico e divertido. O filme de fato é muito voltado para a cultura colombiana e o termo “encantado” em inglês não traduz exatamente o que acontece, as coisas diferentes que parecem “mágicas”. Mágica não é a explicação, não há uma explicação exata e na Colômbia temos isso. O realismo mágico das obras de Gabriel García Marquez, que é tanto a gente. Esse não é o gênero do filme, mas está lá também. O filme representa a cultura colombiana muito bem.
Houve um rumor inicial de que a trama seria passada no Brasil, mas é essencialmente colombiana, porém podemos nos identificar com ela.
Sim, é uma trama universal, na verdade. Poderia ser em qualquer país mas eu fico tão feliz que se passa na Colômbia! (risos)
Encanto, além da latinidade, traz inclusão também na tela
Sim, todos têm aparência diferente. É muito bom ver isso na família: personagens com pele mais clara, outros mais escura, cabelo liso ou encaracolado. É o que somos na América Latina. E isso é novo! Espero que agora passe a ser algo comum, mas não falo isso como uma crítica, apenas que foi muito bom ver a diversidade em “Encanto”.
E qual é a principal mensagem do filme, no seu ponto de vista?
No filme, os dons mágicos são como uma metáfora para os papéis que assumimos em nossas famílias, sabe? A forte, a perfeita, papéis que podem em algum momento serem maus, então antes de mais nada a mensagem é se divertir, mas ao mesmo tempo perceber que não precisamos viver esses papéis. É ok sermos quem somos, e talvez o pequeno detalhe que nos faça sentir estranhos ou envergonhados é exatamente o que nos faz ser especial. Espero que as pessoas pensem nisso!