A história de Manoela, que se apaixonou pelo padre de sua cidade
Tema de seriados, filmes e lendas, o amor proibido entre um padre e uma mulher nem sempre termina do mesmo jeito
Talvez você não tenha assistido ao seriado britânico Fleabag e estranhe o título desta coluna. Ainda mais, porque não precisamos viajar até o Reino Unido para encontrar uma personagem tão intrigante quanto a do seriado. Sim, aqui mesmo, no nosso folclore brasileiro, temos uma história similar: a lenda da Mula Sem Cabeça.
Bem resumidamente, a lenda brasileira e a sinopse da série de televisão podem ser descritas assim: uma mulher se apaixona por um padre e sofre as consequências disso. No Brasil, ela se transforma em uma mula sem cabeça; na versão britânica, ela leva um fora (do padre) e sai de coração partido.
Esse enredo, porém, não é exclusivo da ficção.
Hoje vamos contar a história de Manoela*, uma garota que se apaixonou por um jovem padre de sua cidade. Manoela teoricamente é católica, foi batizada, mas como uma boa millennial, no auge dos seus 28 anos, tem outros métodos de se conectar com a espiritualidade. Um belo dia, ela conheceu Joel*, o padre responsável pela paróquia do município.
Joel, recém-saído do seminário, aos 25 anos, estava experimentando sua primeira posição como pároco. Os dois não se conheceram na igreja, mas sim em uma ação social organizada pela mãe de Manu, na qual ela sempre ajudou desde pequena. A partir desse encontro, os dois estabeleceram uma amizade íntima. Por estarem sempre engajados na comunidade, acabavam passando bastante tempo juntos. A única exceção era a igreja, já que Manu não frequentava as missas nem os eventos da paróquia.
Dois anos se passaram, e a amizade entre os jovens cresceu consideravelmente. Não demorou muito para ambos perceberem que seus sentimentos iam além do amor fraternal. Isso ficou ainda mais evidente quando, após coordenarem uma ação social, Manu tomou a iniciativa e roubou um beijo de Joel, que correspondeu com fervor.
O que se seguiu foram inúmeros encontros secretos, que alimentavam a paixão. De início, Manoela não se sentiu desconfortável com o envolvimento com Joel. Tudo mudou, no entanto, quando ele revelou seu desejo de abandonar o sacerdócio para viver esse amor. A notícia deixou Manu apavorada, e ela rapidamente o dissuadiu da ideia. Não porque temesse o julgamento alheio — isso poderia ser facilmente contornado. A questão era que, apesar do amor, Manoela não via um futuro ao lado de Joel. Era uma paixão com começo, meio e fim.
Apesar de compartilharem muitas opiniões, Joel era mais conservador em certos aspectos, o que fazia com que Manu se sentisse insegura sobre o futuro do relacionamento. Questões fundamentais para ela, como a legalização do aborto, a liberdade feminina e os direitos LGBTQIA+, eram pontos de discordância entre eles. Mesmo com a declaração de amor de Joel, Manoela decidiu que o último encontro deles seria definitivo, por mais dolorosa que fosse essa decisão.
O relacionamento dos dois nos mostra a complexidade das relações humanas. Às vezes, o amor não é suficiente para superar diferenças fundamentais. Isso nos faz refletir sobre a importância da integridade pessoal e da autenticidade nos relacionamentos. Manoela foi sincera consigo mesma ao reconhecer a importância de seus valores.
No final das contas, o afastamento dos dois gerou um certo burburinho na cidade, principalmente entre as carolas da igreja, que notaram a falta de brilho nos olhos do jovem padre durante as missas de domingo. A situação só se resolveu quando Joel foi transferido para outra região, alguns meses depois.
Manu nunca mais teve notícias dele e, ao contrário da lenda brasileira, não se transformou em uma mula sem cabeça por se envolver com um padre. No entanto, ela sabe que, assim como na série britânica, aquele amor que compartilhavam “vai passar”.