A uma hora de Salvador, capital da Bahia, distância medida pela duração de uma vagarosa travessia de ferry boat pela Baía de Todos os Santos, moradores da Ilha de Itaparica convivem com os efeitos negativos das ações humanas no quintal de casa.
Décadas atrás, quem investiu em uma propriedade com fácil acesso para a praia imaginou que a posse seria um belíssimo investimento para o futuro. Em janeiro de 2021, mês que marca o início da Década Internacional da Oceanografia para o Desenvolvimento Sustentável, iniciativa das Nações Unidas, a conta chegou com prejuízos para quem vive a poucos passos do oceano: crateras em meio ao concreto formadas pelo impacto das ondas, uma faixa de areia cada vez mais estreita e casas de frente para o mar que vêm sendo destruídas.
Alguns trechos da costa sumiram por completo. Há cinco anos, havia praia suficiente para um campo de futebol; atualmente, uma estreita camada de areia ressurge somente nos períodos de maré baixa.
Quando se fala em aquecimento global e mudanças climáticas, uma das principais e mais dramáticas consequências é o aumento do nível do mar. Cidades inteiras e nações insulares podem desaparecer do mapa. Ao mesmo tempo, talvez esta seja uma das transformações mais difíceis de se compreender sem que a água comece a subir até o pescoço, literalmente.
A sensação de efeito intangível é uma falsa ideia de que este problema está muito distante — diversas regiões litorâneas já sofrem com processos de erosão e desgastes causados pela força do mar, a exemplo da Ilha de Itaparica.
No caso da ilha baiana, a situação foi acelerada por obras de engenharia: um espigão de um resort mudou a dinâmica de sedimentos na praia e moradores construíram muros que potencializaram a erosão costeira.
Na última década, o nível do mar aumentou 3,6 milímetros a cada ano. Até 2100, 200 milhões de pessoas serão ameaçadas e outras 160 milhões vão sofrer com a frequência maior de inundações por causa do mar.
Em dezembro de 2020, pesquisadores do Imperial College London publicaram um estudo no qual demonstraram que o aumento do nível do mar poderá ser maior do que o previsto pelo Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas, o IPCC, para 2100.
Segundo as estimativas do órgão das Nações Unidas, no cenário mais dramático, de aumento superior a 4ºC na temperatura global, a alteração do nível dos oceanos poderá atingir entre 0.61 centímetros e 1,10 metro, em comparação com os níveis de 1950.
Contudo, pesquisadores do Imperial College afirmam que faltam informações sobre os processos de derretimento dos mantos de gelo para compreender o impacto que essa massa terá nos oceanos.
De acordo com o oceanógrafo e coautor do estudo, John Englander, “o aumento do nível do mar será uma das questões mais desafiadoras para a sociedade nas próximas décadas. Temos que reconhecer que não podemos esperar até termos clareza sobre o real cenário para começarmos a nos planejar”.
Diante da urgência ambiental, entre outros aspectos que ameaçam a preservação da vida marinha — como poluição, sobrepesca, pesca ilegal, etc. —, as Nações Unidas decidiram dedicar a próxima década à ciência oceânica. O período será de estímulo à formulação de estratégias nos países em busca de uma gestão sustentável dos oceanos para atingir os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável da Agenda 2030.
Ao mesmo tempo, a proteção dos oceanos não é uma missão restrita à comunidade científica. Atitudes individuais são essenciais para reduzir a pressão por recursos naturais do planeta e frear o aquecimento global, que interfere diretamente nos ecossistemas marinhos.
As decisões vão desde recusar plásticos de uso único, como canudos e copos descartáveis, até escolher alimentos de produção sustentável e priorizar fontes de energia limpas. A saúde dos oceanos e do planeta depende de cada um de nós.
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