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Precisamos falar sobre a dependência emocional

É inadiável que as mulheres trabalhem profundamente para conquistar a liberdade de gozar de uma habilidade preciosíssima, a autonomia emocional

Por Izabella Borges
Atualizado em 14 fev 2023, 09h36 - Publicado em 26 jan 2023, 12h01
Bruna Griphao e Gabriel Fop, no BBB 23.  (Reprodução/TV Globo)
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Um príncipe. Esse foi o adjetivo usado por Bruna Griphao ao descrever Gabriel, no BBB 23. O mesmo “príncipe”, poucos dias após o início do relacionamento e após uma gama de grosserias e insultos, foi aquele que disse que a sua “princesa”, já já, levaria uma “cotovelada na boca”. Em um cenário de dependência emocional, por estar “respirando ele” – em suas próprias palavras -, ela se submete. 

Vejo esse caso como emblemático. Há muitas mulheres como a Bruna por aí, empoderadas, donas de si, senhoras de suas vidas, mas que seguem ali, submetidas, aceitando comportamentos abusivos de homens, sem a verdadeira percepção do que está acontecendo. 

Vejam quantos elementos podemos explorar nessa análise. A começar pelo egocentrismo do homem branco, heterossexual de beleza padrão. Aquele homem que conhece bem as dinâmicas do machismo estrutural e se privilegia dele. Com a autoestima inabalada, cria situações que alimentam a dependência emocional. Mantem a mulher em dúvida, com brincadeiras que geram insegurança e alimentam questionamentos: será que sou culpada disso? Preciso demonstrar mais carinho e afeto para que ele ceda? Como devo me comportar para ser aquilo que ele espera que eu seja? Será que é o meu comportamento que desperta a agressividade dele?

É exatamente aí que mora o perigo. Na perda da espontaneidade. Mudar a forma de agir, se tornar aquilo que a mulher idealiza que o homem gostaria que ela fosse, se isolar socialmente para estar mais próxima do homem e mais distante das pessoas que criticam a dinâmica abusiva do relacionamento.

O que mantem a mulher, mesmo aquela empoderada e independente, nessa situação, tem nome: dependência emocional. E sim, podemos dizer que qualquer mulher, seja ela quem for, pode viver essa dinâmica em algum momento de sua vida.

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E sabe por que? Porque nós, mulheres, temos vulnerabilidades diferentes, cada uma de nós carrega uma história própria, marcada por traumas, dores, que são consequências das experiências que vivenciamos desde o nascimento.

A falta de repertório sobre relacionamentos saudáveis é um dos motivos que nos leva a aceitar, permanecer. Como ter senso crítico para compreender profundamente que um relacionamento íntimo de afeto poder ser um veneno para a alma sem ter vivido ou visto um relacionamento saudável de verdade? Quantas de nós cresceu em um lar livre de violências?

Aqui eu não falo apenas sobre acesso à informação. A informação sobre a violência baseada no gênero tem sido disseminada de forma mais abrangente nos últimos tempos. Mas precisamos dar um passo além. Precisamos assimilar não apenas mentalmente, mas emocionalmente, energeticamente, espiritualmente e fisicamente para que haja uma verdadeira libertação sistêmica e ancestral, em todos os nossos campos e corpos. 

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Há cerca de 60 anos, as comunicações dirigidas às mulheres não falavam sobre empoderamento. Muito ao contrário, falavam sobre estratégias para manter a casa em ordem, para agradar o marido, que deveria encontrar o conforto no lar. Submissão. Perda da espontaneidade. Passamos séculos sendo ensinadas a servir, cuidar, entender, a agir para agradar.

Hoje precisamos falar sobre como agir para nos livrarmos da dependência emocional que ainda está impressa em nós, por todos os lados que a gente olhe, o estigma está lá. O inconsciente coletivo nos sugere a competição feminina, é competir para conquistar o homem mediano. Afinal, se você não o fizer, outra fará, já que fomos criadas e ensinadas que seremos salvas pelo príncipe que desperta a princesa adormecida. Adormecida, sim, pela própria utopia social. Ninguém poderá nos salvar se permanecermos distantes da autorreflexão, se nos afastarmos das dores que carregamos por termos nascido mulheres. É preciso despertar, assimilar toda a informação que pudermos sobre esse jogo de poder ao qual fomos inseridas sem que nos perguntassem previamente. Despertar, assimilar, elaborar e transmutar as feridas invisíveis para nos tornarmos verdadeiramente livres.

Livres para viver com espontaneidade, para amar sem disfuncionalidades, para receber e também entregar. Esse dia chegará, mas precisamos assumir compromissos irrevogáveis com a gente e encarar de frente esse buraco emocional que é tão profundo e tão avassalador que nos faz ceder, ficar, aceitar, perder o brilho e, em muitos casos, até a vida.

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É inadiável que a gente trabalhe profundamente para conquistar a liberdade de gozar de uma capacidade preciosíssima, a nossa autonomia emocional. Habilidade emancipatória, libertadora, que nos permitirá levantar da mesa quando o amor não for servido, como diria Nina Simone.

Em um país onde 26 mulheres sofrem agressões físicas a cada hora, onde os chamados ao 190 crescem exponencialmente, onde 81,7% dos feminicídios são praticados por homens companheiros ou ex-companheiros das vítimas, precisamos reagir, por você, por nós, pelas nossas filhas, pelas nossas ancestrais. Não permaneceremos! 

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