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‘Aves de Rapina’: entenda a importância do novo filme de Margot Robbie

A ousadia de "Aves de Rapina: Arlequina e sua Emancipação Fantabulosa" pode ser um divisor de águas na cultura pop contemporânea.

Por Júlia Warken, Guta Nascimento, thiagoabril
Atualizado em 7 fev 2020, 09h40 - Publicado em 6 dez 2019, 15h00
 (CCXP/I Hate Flash/Divulgação)
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Filmes de super-heróis são cinema? Martin Scorcese acredita que não e muita gente concorda com ele. A discussão sobre arte vs. entretenimento de massa está longe de ser novidade, mas ganha força no cenário atual. As pessoas estão cada vez menos dispostas a pagar para ir ao cinema, mas os filmes com explosões e gente voando continuam a render uma fortuna aos estúdios. Paradoxalmente, enquanto produções independentes estão à míngua, parece não haver limites para o volume de dinheiro movimentado por franquias como “Vingadores”, por exemplo.

Analisar esse cenário pode ser perturbador, mas uma coisa é certa: os filmes de super-heróis têm um peso gigantesco na cultura contemporânea. É o que os jovens consomem, é o que atrai hordas de pessoas a eventos como a CCXP (Comic Con Experience) – um megafestival que reúne fãs da cultura geek em São Paulo. Criada em San Diego, nos Estados Unidos, a Comic Con acontece na capital paulista desde 2014 e cresce a cada edição. Com ingressos esgotados, um público de 280 mil pessoas está lotando os quatro dias de evento esse ano (de 5 a 8 de dezembro).

Os painéis dos estúdios de cinema são a atração mais disputada e o número de celebridades vem aumentando ano após ano. Em 2019, o painel mais importante do primeiro dia da CCXP (quinta-feira, 5) contou com o elenco e a diretora do filme “Aves de Rapina: Arlequina e sua Emancipação Fantabulosa”, protagonizado por Margot Robbie. No novo filme da DC Comics, ela volta a dar vida à Arlequina, célebre vilã dos quadrinhos do Batman.

Margot já havia interpretado o papel em “Esquadrão Suicida”, filme que acabou sendo massacrado pelo público e pela crítica em 2016. Mesmo com a repercussão ruim, Arlequina conseguiu se destacar positivamente no longa, virando queridinha entre as cosplayers. Numa aposta ousada, o visual da personagem foi totalmente repaginado para o cinema – e a mudança agradou os fãs. Os looks de Arlequina ganham ainda mais destaque em “Aves de Rapina” e esse já é o filme mais fashionista já lançado no nicho dos quadrinhos.

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(Warner/DC Comics/Divulgação)

Mas, afinal, o que torna o filme importante?

Gradativamente, as mulheres estão ganhando mais destaque no universo dos filmes de heróis. “Mulher Maravilha” é o maior sucesso recente da DC nos cinemas e “Capitã Marvel” veio logo após, como uma resposta da Marvel – que também vai lançar o filme solo da “Viúva Negra” em 2020. Na TV, as séries “Jessica Jones” e “Supergirl” foram lançadas em 2015 e “Batwoman” estreou em outubro desse ano.

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Mesmo assim, é justo dizer que “Aves de Rapina” se destaca nesse cenário. O subtítulo “Arlequina e sua Emancipação Fantabulosa” já deixa a proposta muito nítida: o que vamos ver não é apenas a história de uma mulher, é a história de como essa mulher que está se emancipando.

A tal emancipação de Arlequina tem a ver com um outro famoso personagem dos quadrinhos do Batman: o Coringa. E é desnecessário dizer que ele é o vilão mais icônico de Gotham City – aliás, muitos o consideram o maior vilão de HQs de todos os tempos. Arlequina e Coringa formavam um casal e mantinham um relacionamento extremamente tóxico.

Ou seja: temos aqui a história de uma mulher encontrando a redenção depois livrar-se do relacionamento abusivo que tinha com um homem poderoso. Essa temática já havia sido abordada na série “Jessica Jones”, mas “Aves de Rapina” tem uma magnitude muito maior, por ser uma das estreias mais importantes ($$$) do cinema mundial em 2020.

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E isso não é tudo: Arlequina não está sozinha e tem a seu lado um time de anti-heroínas. Canário Negro (Jurnee Smollett-Bell), Caçadora (Mary Elizabeth Winstead), Renee Montoya (Rosie Perez) e Cassandra Cain (Ella Jay Basco) formam com ela o clã conhecido como Aves de Rapina. “Eu queria um novo início. Mas eu não era a única mulher em Gotham buscando por emancipação”, diz a protagonista no trailer do filme, resumindo o que fez essas mulheres se unirem.

Outro ponto que merece ser ressaltado é o fato de que as mulheres comandam “Aves de Rapina” também atrás das câmeras. A direção é assinada por Cathy Yan, cineasta chinesa que faz sua estreia no mundo das grandes produções. Antes do filme da DC, ela só havia dirigido um longa-metragem pouquíssimo conhecido, chamado “Dead Pigs”. E no roteiro temos Christina Hodson, que escreveu “Bumblebee” e também é corroteirista de “The Flash” e “Batgirl”, dois filmes da DC ainda sem data de lançamento.

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Da esquerda para a direita: Rosie Perez, Ella Jay Basco, Jurnee Smollett-Bell, Margot Robbie, Mary Elizabeth Winstead, Cathy Yan e Mari Moon (CCXP/I Hate Flash/Divulgação)

A ousadia de “Aves de Rapina”

Como já foi dito, “Esquadrão Suicida” acabou decepcionando a maioria dos fãs. O filme prometia muito e contava com trailers empolgantes, mas não entregou um bom produto final. Mesmo assim, a Warner (estúdio por trás de tudo que a DC lança no cinema) está apostando num spin-off e também vai lançar a continuação de “Esquadrão Suicida”. A ousadia já começa aí.

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Na corrida bilionária dos filmes de HQs, a DC Comics está sempre atrás da Marvel ($$$) e busca redenção. Comendo pelas beiradas, lançou “Coringa” esse ano e conseguiu um prestígio inédito no universo cinematográfico das HQs. Vencedor do prêmio máximo do Festival de Veneza e cultuado como “filme cabeça”, o longa provou que a Warner tem competência para inovar dentro do nicho.

“Aves de Rapina” representa uma nova página nesse cenário de inovação. Ele não se propõe, de maneira nenhuma, a seguir os moldes de “Coringa”, mas, tal qual o filme de Joaquin Phoenix, tem uma ousadia própria. Isso porque universo geek ainda é muito machista.

Em eventos como a CCXP, basta conversar com as cosplayers, as gamers e as quadrinistas para se dar conta dessa realidade. Estamos avançando, mas o cenário está longe de ser um mar de rosas. Falar sobre emancipação feminina em uma megaprodução como essa é uma cartada ousada. Assumir um visual escancaradamente fashionista para essa produção é uma cartada ousada. E, por fim, apostar numa diretora inexperiente para comandar esse filme é, também, uma cartada ousada.

Os grandes estúdios estão cada vez mais atentos à diversidade, mas o risco dessa empreitada é altíssimo. Ninguém faz filmes de HQ para perder dinheiro, pela “lacração”.

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Ousadia no roteiro e na proposta visual (Warner/DC Comics/Divulgação)

E é isso que o público quer?

Já está provado que tramas com mulheres no comando conseguem fazer sucesso no universo geek. Dentre as apostas ousadas que deram certo recentemente, é impossível não citar “Mad Max – Estrada da Fúria”. Na franquia mais consagrada da história do cinema, “Star Wars”, a heroína Rey também calou a boca de muita gente e mostrou que uma garota pode ser a Jedi mais poderosa da galáxia. Mesmo assim, é difícil prever se “Aves de Rapina” vai entrar para essa lista de sucessos.

O que já podemos dizer é que a CCXP foi à baixo na última quinta-feira com a presença das estrelas do filme. E mais: no painel, a mulherada falou abertamente sobre feminismo, assunto que muitas vezes é vetado em entrevistas, sob a justificativa de que isso afugenta o público.

“Quem acha que as mulheres vão dominar o mundo?”, perguntou a DJ responsável por animar a plateia da CCXP antes da chegada das atrizes e da diretora. Em resposta, a vibração do público foi geral. “E quem acha que elas já dominaram?”, provocou novamente a DJ – resultando em mais uma resposta positiva. Frente às imagens exclusivas mostradas ao público, outra onda de entusiasmo ecoou com força total na arena do evento.

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Painéis sempre lotados: vindos de todo o Brasil, os fãs chegam a dormir na fila da CCXP (CCXP/I Hate Flash/Divulgação)

Em dado momento, Mary Moon, a mediadora do painel, falou a Margot e cia que o feminismo está crescendo no Brasil – e não houve nenhuma manifestação de descontentamento na plateia. Se alguém se incomodou, ficou calado. Nesse momento, Margot disse: “e o feminismo não é só para mulheres, os homens podem ser feministas também”. Em resposta, o público vibrou mais uma vez e a atriz abriu um enorme sorriso.

Fora do painel de “Aves de Rapina”, quem circula pela CCXP também pode constatar o sucesso de Arlequina. Esse ano é fácil ver que a personagem é a mais homenageada por quem faz cosplay. Tanto a versão de Margot Robbie, com o inconfundível cabelo azul e rosa, quanto a tradicional indumentária da personagem nos quadrinhos – mais parecida com o arlequim do imaginário popular – têm grande aderência entre quem se veste à caráter.

A expectativa por “Aves de Rapina” é alta, mas apenas no ano que vem a gente vai saber a resposta definitiva quanto ao sucesso – ou o fracasso – do filme. A boa notícia é que a espera não vai demorar muito, pois o longa chega aos cinemas em 6 de fevereiro. Mesmo assim, seja qual for a opinião do público e da crítica após a estreia, já é um avanço ver uma produção como essa no concorrido nicho dos filmes que ainda lotam salas de cinema.

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