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Na capa: Majur nos conduz a uma viagem de amor ao próximo

Uma das vozes mais poderosas da música brasileira, Majur coleciona feitos na carreira, com apenas 28 anos

Por Isabela Pétala
Atualizado em 10 nov 2023, 11h37 - Publicado em 10 nov 2023, 11h00
Para além dos discos e singles, ela também nos conduz em uma viagem pelas profundezas do oceano que é amar o outro e, principalmente, a si mesma. (Camila tuon/CLAUDIA)
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Atenção: a história a seguir é digna de conto de fadas, mas não exatamente do jeito que você imagina. Tudo começa sob o sol de Salvador. Aos cinco anos, uma pequena Majur entra para cantar na igreja e, depois, no coro da Orquestra Sinfônica da Juventude de Salvador. O que poderia ser apenas uma brincadeira de criança, na verdade, reluzia profissionalismo em seus olhos. “Eu já me enxergava, via que poderia cantar. Eu queria estar lá”, relembra.

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Vestido e calça, ambos Missoni. Lenços, Louis
Vuitton e Scarfme; colar, Rincawesky; brincos, Louis Vuitton; pulseiras, Tatiana Queiroz, Nadia Gimenes e Carlos Penna; anéis, Carlos Penna. (Camila Tuon/CLAUDIA)
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No coro de sua igreja em Salvador, Majur se descobre uma verdadeira profissional. (Camila Tuon/CLAUDIA)

Depois de alguns anos, ela virou solista no coral. Na adolescência, se dedicou a entrar na faculdade para ajudar sua mãe e irmãos em casa. A arte inevitavelmente seguia em seu sangue e, então, foi cursar Design. No último semestre, percebeu que não era bem aquilo que gostaria de trilhar. Mas nada estava perdido. Inclusive, pelo contrário.

Ela aproveitou o TCC e dedicou-se ao projeto de vida: roteirizar exatamente quem gostaria de ser. Durante nossa entrevista, via Zoom, Majur correu animada para procurar os moodboards daquele tempo. Após vasculhar uma das bolsas de sua recente mudança para São Paulo, achou os papéis. Neles, o afrofuturismo aparece em destaque, assim como os planos para lançamentos musicais.

“Professores e livros na escola não falam sobre mim. Eu nunca tive essas referências na minha juventude. A autoconfiança foi a maior base para formar a Majur de hoje”, conta.

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Look, Von Trapp. Colar
e pulseira, Bulgari;
brincos, acervo (Camila Tuon/CLAUDIA)
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Ela, que começou cantando em bares da capital baiana, lançou, em 2018, o seu primeiro EP, Colorir. O projeto chegou até Paula Lavigne, que passou a agenciá-la na época, e também a Liniker, uma de suas maiores inspirações e, agora, grande amiga.

Aos 23, foi a primeira brasileira a ser repostada no Instagram oficial da Gucci — o antigo diretor criativo da marca, Alessandro Michele, a admirava profundamente.

Em 2019, foi convidada para participar da canção “AmarElo”, com Emicida e Pabllo Vittar. “Eu estava no Uruguai [bairro em que cresceu em Salvador] e, de repente, tudo mudou. Por que eu?”, questiona sobre sua jornada.

Em 2021, Majur seguiu sua ascensão meteórica ao lançar o primeiro disco, Ojunifé. No idioma iorubá, significa “olhos de amor”, termo apelidado por seus guias espirituais.

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Vestido e acessórios, Dolce & Gabbana (Camila Tuon/CLAUDIA)
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Majur usa full look, The Paradise. Acessórios, STRUKTURA. Sandálias, Eurico (Camila Tuon/CLAUDIA)

No entanto, bem antes disso, o destino já havia mostrado que a paixão tomaria conta de seu ser por inteiro. “Tinha vivido alguns relacionamentos, mas, na hora do compromisso, eu fugia. Foram vários amores deixados na rede dessa sereia”, diz.

“Como eu iria me relacionar sendo uma travesti? No meio desse processo, eu me encontro, faço santo [processo de iniciação no candomblé] e reencontro Josué [Amazonas, seu ex-companheiro].”

A retomada da magia de outros tempos que ela dividia com o coreógrafo foi orquestrada pelo irmão dele, após a cantora encontrá-lo por acaso como motorista de Uber.

A partir dali, o casal nunca mais se desgrudou. Com três anos de relacionamento, em setembro de 2022, se casaram na capital baiana cercados de amigos e familiares.

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As fotos com o mar ao fundo pareciam saídas dos mais belos filmes de romance. No entanto, após um ano, a dupla surpreendeu os fãs e anunciou o fim do casamento.

Compartilhando pela primeira vez as nuances que levaram à dissolução do relacionamento para esta matéria, Majur admitiu, no início da conversa, que estava nervosa. Mas com muita vontade de falar e, ainda, de cantar.

Ela revela que o disco ARRISCA, de maio deste ano, relata o que estava sentindo no âmbito a dois. No entanto, não teve coragem de admitir publicamente suas inspirações. Até agora.

Na música “Tudo ou Nada”, a cantora fala, por exemplo, sobre a autossabotagem que sentia ao esperar que iria viver um casamento perfeito, sem pensar nos atravessamentos que uma relação pode ter. “Apesar de nos encontrarmos em algumas semelhanças, nosso repertório de vida e o desenrolar da nossa jornada são diferentes.”

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Segunda pele e saia, Reinaldo Lourenço; bomber, Victor Zerbinat; hot pant, Cris Barros. Joias, Tatiana Queiroz; e óculos, Balenciaga. Sandálias, Euric. Majur senta sobre cadeira, Sergio Matos (Camila Tuon/CLAUDIA)
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A música também foi pensada para contar a Josué quem Majur era, para que ele finalmente pudesse entendê-la. O bailarino compreendeu tão bem o recado que, a partir disso, percebeu a crise que passavam.

Em Na Sua, a artista afirma estar na mira de um caçador carinhoso e perigoso que a flechou, fazendo com que ela se perdesse. E garante que não mente para agradá-lo, percebendo que nem só de fadas se fazem os contos.

Eu me sentia insegura. Mas não tinha a ver com ele. E, sim, com o término dos meus pais.” Ela faz uma pausa e mostra as mãos tremendo ao tocar no assunto.

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Majur revela que a inspiração para o álbum “ARRISCA” foi a sua vida amorosa. (Camila Tuon/CLAUDIA)

“Meu pai nos deixou quando eu tinha 2 anos. Vi a cena dele indo embora. Não sabíamos onde era a casa dele. Ficamos sem luz e sem água, porque quem pagava as contas era ele. Um ato de crueldade que muitas mulheres, principalmente pretas, sofrem quando são abandonadas. O casamento não faz parte do nosso histórico [de mulheres negras], nem dos nossos sonhos”, e acrescenta: “Imagina viver isso e, de repente, não ser aquilo [dar certo]?”

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Do outro lado, Josué passava por questões ligadas a desafios enquanto um homem preto no Brasil. A cobrança por um emprego socialmente aceito, a missão de ajudar a família… Em certo momento, Majur conta que ambas as vivências desaguaram em uma espécie de competição para ver quem sofreu mais.

E, apesar de tentar ajudá-lo ao realizar projetos juntos, em meio a brigas motivadas pelo trabalho, e os desencontros da rotina, a cantora percebeu que aquilo não seria o suficiente para ele.

“Me sinto na história da Rainha Charlotte [série da Netflix]. Uma rainha e um rei, cada um com seus talentos, mas ele queria algo além. E ela corria atrás, mas também queria a presença dele. Mas para ele, não era só isso… Como é difícil lidar com a individualidade no casamento”, reflete.

Na música Seu Amor, que dedicou para o coreógrafo no dia da cerimônia, Majur já sabia que ele precisaria ir embora para viver, mas que, mesmo assim, estaria ali por ele.

“Amar é também saber que não se pode transformar o amor em dor, porque isso é maldade. Eu não queria ser má, e nem ele”, diz, sem conter as lágrimas.

“Eu admiro a fome que ele tem de ir atrás do que quer. Seria contraditório viver com alguém se sentindo amarrado, sendo que eu subo no palco e falo para os meus fãs viverem os respectivos sonhos”, acrescenta.

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Vestido, Penha Maia; sobre camiseta, Coven, e hot pant, Cris Barros. Chapéu, Cassia
Cipriano; e brincos, Louis Vuitton. Sandálias, Eurico (Camila Tuon/CLAUDIA)

A cantora garante que, apesar de entender as lutas de seu ex-marido e, agora, amigo, ela também teve os seus enfrentamentos e batalhas. E afirma: depois de sofrer com o processo de separação, ela está em outra fase, com mais perspectiva.

“Estou bem. Sei que posso chegar mais longe.” Dito e feito. Com 28 anos recém completados, e comemorados em sua cidade natal, Majur, uma libriana nata, mal pode esperar para percorrer os caminhos que bem desejar.

Eu cresci muito e vou me tornar a grande mulher que nasci para ser. Tenho repertório para mudar, me relacionar, casar, separar”, diz. Ela também atribui as características desse novo ciclo ao início de seu retorno de Saturno (sim, somos místicas também).

Nessa renovação, a cantora aproveita para dizer que, na verdade, nasceu somente quando tinha 23 anos e mudou o seu nome de batismo. Majur dos Santos Conceição. Ela pede para não esquecerem desse nome — o que seria impossível.

“Queria que as pessoas soubessem que eu sou apenas uma menina. A minha verdadeira infância foi só a partir daquele momento. Faz quatro anos que eu me reconheço”, conta.

“Precisava desse balançar para voltar a ser quem eu sou. Eu não preciso mais me arriscar. Agora, tenho certeza do que eu quero fazer.”

E, afinal, o que é que Majur quer? “Carreira!”, ela responde rindo — e sem poupar desejos. Quer desfilar para grandes marcas em Milão, exercendo sua veia inegável de supermodelo. Quer melhorar o francês. Quer passar seis meses na Europa. “Quero descobrir o que o mundo tem para mim”, diz.

A curto prazo, já tem concretizações de tirar o fôlego. E, dessa vez, sem precisar atravessar o mar para isso. “Agora, em novembro, no festival Liberatum, vou encontrar Morgan Freeman, Viola Davis e jantar com Naomi Campbell [ídola da cantora]. Tenho um texto preparado para ela, mas, na hora, acho que só vou falar que a amo e cair no chão”, se diverte.

Além do evento, ela divide horários de prestígio com grandes mulheres da música brasileira no Rock the Mountain (5 e 12/11), no Rio de Janeiro, e integra o line-up do AFROPUNK BAHIA (18 e 19/11), em Salvador.

“É um reconhecimento do meu trabalho enquanto artista. Meu Deus, o quão longe eu estou chegando. Isso é só o início”, reflete emocionada. “Parece que tudo isso está me dizendo: ‘Majur, você é foda sozinha, acompanhada, tanto faz. Só vai!’”

Como se não bastassem as novidades, ela entrega que os projetos sucessores do disco ARRISCA estão vindo. Primeiro, um EP a ser lançado até o fim do ano com músicas sobre tudo o que ela enfrentou nos últimos meses. Já em 2024, as lágrimas ficam para trás: apenas suor, busca por novos crushes e muito axé, gênero musical que será destaque em seu novo disco.

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Vestido, Ferragamo. Brincos e acessório, Carlos Penna, aneis, Tatiana Queiroz (Camila Tuon/CLAUDIA)

Encontrar amor no se ver e cultivar a vontade de crescer novamente, mesmo depois de ter se jogado no fundo, mesmo no auge da dor. Esses são alguns dos mantras presentes em uma das músicas inéditas que a artista cantou em primeira mão durante esta entrevista. E que mostram, neste conto de fadas, a potência do amar, desejar e deixar, e fazer tudo novamente, assim como a maré que convida Majur — e a todas nós — a sonhar e fazer contato com tudo que cada onda nos trouxer. “Amar é também saber que não se pode transformar o amor em dor, porque isso é maldade.”

Majur

Eu cresci muito e vou me tornar a grande mulher que nasci para ser. Tenho repertório para mudar.”

  • TEXTO Isabela Pétala 
  • Fotos Camila tuon
  • Styling bruno pimentel
  • Beleza camila anac
  • Tranças Sttefone
  • Direção de arte kareen sayuri
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