Série mostra que sabemos pouco sobre o que foi a escravidão no Brasil
"Sankofa - A África Que te Habita" fala sobre a escravidão com base em uma expedição feita por dez países africanos.
A Lei Áurea foi assinada em 13 de maio de 1888 e apenas 132 anos nos separam daquele Brasil em que a escravidão era uma prática legal. É pouquíssimo tempo e, não por acaso, o racismo ainda é muito presente na nossa sociedade.
Todos nós aprendemos sobre a escravidão na escola, mas quantos de nós compreende, de fato, a dimensão do que foi o regime escravocrata no Brasil? Essa é uma pergunta que surge na mente de quem assiste a “Sankofa – A África Que te Habita”, série documental exibida pelo canal pago Prime Box Brazil.
A saber: o Rio de Janeiro foi a cidade que mais recebeu africanos escravizados no mundo – cerca de 5 milhões. Desses, 1 milhão desembarcou apenas no Cais do Valongo, um polo escravagista cuja história foi convenientemente esquecida durante mais de um século. Ao todo, acredita-se que entre 12 milhões e 12,5 milhões de africanos escravizados foram trazidos às Américas. “Sankofa” revela esses números impressionantes e muitos outros fatos a respeito do tema.
Ao longo de 10 episódios de meia hora, a série conta os detalhes de uma expedição feita pelo fotógrafo César Fraga e pelo historiador Maurício Barros de Castro. Eles viajaram pelos dez países que compunham a rota da escravidão das Américas: Cabo Verde, Senegal, Guiné Bissau, Gana, Togo, Benim, Nigéria, Angola e Moçambique. A ideia era conhecer melhor o “outro lado” da história da escravidão, bem como os laços que unem culturalmente o Brasil a esses países.
A viagem aconteceu em 2013 e deu origem a um livro e a uma exposição. Ao ver a riqueza das fotografias de César – são mais de 4 mil imagens – e das histórias que ele e Maurício tinham para contar, a diretora audiovisual Rozane Braga teve a ideia de transformar esse material em uma série. Ela e a roteirista Zil Ribas há tempos já tinham vontade de encabeçar um projeto desse tipo, focado na diáspora negra.
Além dos riquíssimos relatos de César de Maurício, “Sankofa” também conta com depoimentos de diversos pesquisadores e pessoas ligadas à cultura afro, além da narração da atriz Zezé Motta. O resultado é uma verdadeira aula sobre escravidão, racismo, ancestralidade africana e resistência negra. Sankofa é um pássaro mítico africano imortalizado pelos ancestrais dos povos axântis, que hoje vivem em Gana. O símbolo de um pássaro com a cabeça virada para trás pegando um ovo significa “volte e busque”. No sentido filosófico, quer dizer que é preciso retornar ao passado para ressignificar o presente e construir o futuro.
“Acredito que é muito importante que o audiovisual faça reverberar essas questões. Da mulher negra, dos escravizados, da influência africana na nossa cultura. Eu acho que fazer a pessoas pensarem sobre isso é o grande legado que essa série deixa”, diz Rozane.
A diretora comemora a estreia da série e conta que aprendeu muito durante o processo de filmagem. “Foi uma aula de história. Uma das coisas que eu achei mais impressionantes, que foi falado pelo [historiador] Manolo Florentino, é que, em dado momento, a rentabilidade do tráfico de escravos estava caindo e começaram a traficar cada vez mais mulheres jovens, para que elas pudessem gerar novos escravos aqui no Brasil. Começam a traficar ventres. Eu não sabia disso. Mulheres de 13 e 14 anos. Elas eram crianças, na verdade”, aponta Rozane.
Ela revela que também não fazia ideia do número de pessoas escravizadas que foram trazidas ao Brasil. “Cada entrevista era uma aula e muitas pessoas da equipe choraram no set de filmagem”.
Rozane conta que já foi procurada por professores interessados em exibir trechos de “Sankofa” em sala de aula. Na conversa com CLAUDIA, ela se colocou à disposição de quem quiser fazer o mesmo. Para solicitar o material, de maneira gratuita, basta enviar um email para rozanebraga@fblvideo.com.br. “Eu terei o maior prazer em ajudar”, garante.
Através da Prime Box Brazil, a série pode ser assistida todas as sextas-feiras, às 20h30, até o dia 3 de julho.
Todas as mulheres podem (e devem) assumir postura antirracista: