Mulheres da Seleção, vocês foram gigantes e merecem o mundo
Está mais do que na hora de a gente brigar pela valorização do futebol feminino. Vamos juntas?
No país do futebol o futebol não é para todos. É para os homens.
Há inequidade no mundo inteiro, a gente sabe bem disso, mas no nosso país o furo é mais em baixo. Por que o brasileiro é absolutamente apaixonado por futebol, é a nossa marca registrada – e mesmo assim não existe uma movimentação efetiva para que as mulheres “participem da festa” também.
Somos convidadas só como expectadoras. Somos ensinadas a endeusar os jogadores de futebol, mas não recebemos apoio para praticar o esporte.
Quantas Martas, Cristianes e Formigas já deixaram de ser descobertas? É só parar para pensar em quantas de nós, mulheres, foram incentivadas a jogar futebol na infância. Na educação física, no campinho do bairro, nas escolinhas. Quantas meninas têm uma bola de futebol para chamar de sua?
Esse é o território deles, não é o nosso.
Até 1979 o futebol era PROIBIDO para as mulheres no Brasil. Quando eram flagradas jogando, as mulheres chegavam a ser encaminhadas à delegacia. Dizia-se que o esforço físico do esporte não era condizente com a condição feminina e que, pasmem, poderia até danificar o útero.
Em 2001, a nossa maior craque da era pré-Marta foi rechaçada por ter raspado o cabelo. Isso porque o Campeonato Paulista, no qual ela jogava, tinha uma cláusula informando que as mulheres deveriam entrar em campo bem arrumadas. A alegação era de que isso aumentaria o interesse do público masculino e que faria o futebol feminino crescer.
Sissi é o nome dessa grande craque. Você já havia ouvido falar dela? Sisleide do Amor Lima era uma gigante em campo, mas fez carreira numa época em que as jogadoras de futebol basicamente só apareciam nas revistas para fazer ensaios sensuais. “Elas batem um bolão” era o trocadilho preferido das reportagens sobre o futebol feminino há bem pouco tempo.
Proibido até 40 anos atrás, reduzido à erotização há menos de 20. Com times de base precários hoje em dia. E com salários absurdamente injustos. Dá para exigir resultado do nosso futebol feminino frente a esse cenário? Não.
E mesmo assim as nossas mulheres brilharam em campo. Fizeram bonito na primeira fase e jogaram de igual para igual com a França. Sendo que, além de estarem competindo em casa, as francesas contam com uma estrutura muito maior do que as brasileiras.
O francês Lyon, por exemplo, é um dos times mais fortes do mundo no circuito feminino. Wéndèleine Renard, a camisa 3 da Seleção Francesa, joga lá e tem um dos maiores salários do mundo dentre as mulheres do futebol.
Todo mundo sabe que os clubes europeus são muito mais fortes do que os nossos e essa não é a questão aqui. O que está em pauta é o fato de que, quando os clubes passam a valorizar o futebol feminino – como acontece na Europa e nos Estados Unidos – isso muda tudo na base. E a gente sabe que a base do futebol masculino é fortíssima no Brasil.
Fora do nosso país o futebol das mulheres também é muito menos valorizado do que o dos homens. Os números das Copas da Rússia e do Catar comparados à da França comprovam isso. Mas, por aqui, as coisas são ainda mais desiguais, por tudo o que já foi citado.
E é por isso que as nossas jogadoras são gigantes. Mostraram muita garra e fizeram bonito em campo. Valeu a pena torcer!
E, pela primeira vez, a Copa Feminina foi acompanhada por milhões de TVs ligadas em todo o Brasil. Além de Marta, de longe a nossa jogadora mais famosa, agora nós sabemos reconhecer o rosto de um time inteiro de mulheres espetaculares. Mulheres que não são apenas incríveis no que fazem, elas são incríveis fazendo algo que a sociedade nos incentiva a não fazer: jogar futebol.
Elas merecem o mundo. E, definitivamente, elas merecem que a gente comece a brigar pela valorização do futebol feminino. Vamos ao estádio ver as nossas mulheres jogando, vamos incentivar que as meninas joguem bola também, vamos pressionar os endinheirados times da Série A a honrarem o futebol das minas.
No país do futebol o futebol tem que ser para todos.