Não confunda parentalidade positiva com falta de limites para crianças
A parentalidade positiva está crescendo, mas isso não significa que as crianças podem fazer o que querem. Conheça aqui essa tendência
A parentalidade autoritária está cada vez mais no passado, abrindo caminhos para uma educação positiva, focada em um desenvolvimento respeitoso e pautado no respeito aos sentimentos. A tendência, no entanto, muitas vezes é não é bem vista: na internet, não são poucas as pessoas que confundem educação infantil positiva com falta de limites.
“Educação positiva não é sinônimo de permissividade ilimitada. Embora a educação positiva valorize o respeito mútuo, a empatia e a comunicação aberta, também reconhece a importância de estabelecer limites claros e consistentes”, revela Tatiana Cicerelli, pediatra com Certificação Internacional em Disciplina Positiva pela Positive Discipline Association.
A confusão surge a partir da dificuldade de impor limites e regras de maneira positiva, visto que tendem a ser associadas ao choro, gritaria, castigos e brigas.
“É crucial estabelecer limites para o desenvolvimento cognitivo e emocional das crianças, porque esses limites fornecem estrutura, segurança e orientação necessárias para seu crescimento”, esclarece Larissa Fonseca, psicóloga clínica.
Por isso, é importante não confundir a educação infantil positiva com um mundo sem limites, e aprender a incorporá-la como aliada das regras. Veja:
O que é educação positiva?
A fronteira entre dar limites e ser autoritário sempre foi turbulenta. As gerações mais novas desejam quebrar os ciclos de parentalidade autoritária – na qual, em muitos casos, os problemas eram resolvidos a partir da violência, seja verbal, psicológica ou física – e optam por métodos que permitam um desenvolvimento cognitivo positivo e livre de medos.
“Diferencia-se de outros métodos de educação por priorizar o reforço positivo ao invés de punições, incentivando a comunicação aberta e o estabelecimento de limites de forma amorosa. Por sua vez, a educação positiva é vista como ‘fora da curva’ porque desafia conceitos tradicionais de disciplina baseados em autoridade e punição”, reflete Tatiana.
É claro, o momento de ruptura com ciclos de medo não é fácil e requer trabalho emocional por parte dos próprios pais, mas é inegável que possui efeitos positivos no desenvolvimento da criança.
“[a comunicação positiva] Favorece o desenvolvimento de diversas habilidades importantes nas crianças, incluindo autonomia e autodisciplina, pois em vez de dependerem exclusivamente de regras rígidas impostas pelos pais, as crianças aprendem a tomar decisões e a regular seu próprio comportamento de forma responsável”, acrescenta a pediatra.
Além disso, diversas discussões têm sido retomadas nos últimos anos a respeito da efetividade de ferramentas de medo na educação infantil e, por sua vez, gera a dúvida se o medo é capaz de ensinar É importante também praticar a empatia e o respeito mútuo, reconhecendo as necessidades e sentimentos das crianças, e colaborar com elas no processo de aprendizagem e desenvolvimento.
Os benefícios da educação positiva
A educação positiva, quando implementada com os limites adequados, pode trazer uma série de benefícios ao desenvolvimento cognitivo e emocional da criança, entre os quais destaca-se a autonomia, autocontrole, empatia e resiliência.
“É importante também praticar a empatia e o respeito mútuo, reconhecendo as necessidades e sentimentos das crianças, e colaborar com elas no processo de aprendizagem e desenvolvimento”, pontua a psicóloga.
“Através da educação positiva, as crianças também desenvolvem habilidades sociais. A comunicação aberta e o respeito mútuo promovidos por ela ajudam os pequenos a desenvolverem habilidades de comunicação, empatia e cooperação, essenciais para interações sociais saudáveis”, explica Tatiana.
Além disso, a pediatra aponta que, por meio da quebra do autoritarismo, estimula-se a autoestima e a confiança, bem como a resiliência emocional, pois em vez de serem punidas por seus erros, as crianças são encorajadas a aprender com as experiências e lidar de forma construtiva com emoções negativas.
Positividade resulta em falta de limites?
Apesar dos diversos benefícios de um modelo de educação positiva, a compreensão e a parceria entre pais e filhos muitas vezes é confundida com permissividade total.
Isso tem levado a cada vez mais casos de crianças que são descritas como descontroladas, desrespeitosas e pouco conscientes em relação a quem os rodeia e, por sua vez, pais temerosos em estabelecer regras para o lar e o dia a dia. Mas uma coisa é certa: a positividade deve ser aliada dos limites.
“Uma educação sem limites e excessivamente permissiva pode resultar em crianças com dificuldade de autocontrole, falta de responsabilidade e respeito pelos outros. Elas podem apresentar comportamentos disruptivos, dificuldades de relacionamento e baixo desempenho acadêmico. Além disso, podem desenvolver uma visão distorcida da realidade, acreditando que podem fazer o que quiserem sem consequências”, alerta a psicóloga.
Os limites também proporcionam aos pequenos segurança, estrutura e organização, ajudando-as a entender o que é esperado delas, promovendo autodisciplina, autocontenção e responsabilidade.
“A diferença entre permissividade e positividade está na abordagem: enquanto uma educação permissiva pode permitir que as crianças façam o que querem sem restrições, a educação positiva busca criar um ambiente de apoio e compreensão, onde os limites são estabelecidos de forma amorosa e respeitosa, visando o bem-estar e o desenvolvimento saudável da criança”, coloca a pediatra.
Como quebrar o ciclo permissivo?
Mas, então, como quebramos o ciclo de permissividade? “Ao invés de punições e castigos, os limites são estabelecidos de maneira construtiva, enfatizando o que é aceitável e incentivando o comportamento desejado. Isso pode ser feito através do reforço positivo, da modelagem de comportamentos adequados e do estabelecimento de expectativas claras e realistas”, coloca Tatiana.
A psicóloga ainda acrescenta que é essencial fornecer apoio emocional e oportunidades para que as crianças expressem suas emoções e aprendam a lidar com elas de maneira construtiva.
Entre as possíveis estratégias para garantir que os limites estão na mesa, a pediatra pontua o estabelecimento de expectativas de forma clara e o reforço de comportamentos desejados, utilizando elogios e recompensas para incentivar e reforçar os comportamentos positivos que estão alinhados com os limites estabelecidos.
É interessante redirecionar os comportamentos indesejados, oferecendo alternativas positivas e direcionando o comportamento da criança para uma atividade mais apropriada.
“Em vez de punições arbitrárias, permita que a criança experimente as consequências naturais de suas ações quando possível. Por exemplo, se a criança quebra um brinquedo por mau uso, ela pode não ter acesso ao brinquedo por um tempo ou pode ajudar a consertá-lo”, recomenda Tatiana.
Ao impor limites, coloque-se no lugar da criança e tente entender suas necessidades e perspectivas. Isso pode ajudar a abordar os limites de maneira mais empática e construtiva.
Aderindo à educação positiva?
Se você ficou curioso em relação a como implementar essas táticas em casa, a pediatra ainda pontua que, ao escolher o modelo, os familiares devem ter alguns pontos em mente:
- Ser modelo de comportamento: Os pais devem praticar o que ensinam, demonstrando respeito, empatia e comunicação aberta em suas próprias interações;
- Ser consistente: É importante estabelecer limites de forma consistente e aplicá-los de maneira justa e previsível;
- Ser paciente: Mudanças comportamentais podem levar tempo e exigem paciência e persistência por parte dos pais;
- Fomentar o diálogo: Incentivar uma comunicação aberta e honesta com os filhos, criando um ambiente onde eles se sintam à vontade para expressar seus sentimentos e preocupações;
- Buscar apoio quando necessário: Não hesitar em procurar orientação profissional ou recursos adicionais, caso surjam dificuldades na implementação da educação positiva.
E, acima de tudo, procure manter a compostura e evite reagir impulsivamente diante de comportamentos desafiadores.