“Meus amigos me chamam de anciã, dizem que eu corto o barato deles porque sou muito sincera e realista. Na verdade, não tenho tempo para firulas”, diverte-se Carolina Ferraz. Bastam alguns minutos com a atriz para comprovar que ela é mesmo uma mulher prática, mas que não há nada de ruim nisso. Um exemplo? Apesar dos 6 graus de miopia, retoca o corte de cabelo sozinha em casa. “Queria ser totalmente autossuficiente. O período que passo no salão pode ser mais bem aproveitado”, garante, mostrando os fios perfeitamente alinhados.
No dia da sessão de fotos para CLAUDIA, deixou o Rio de Janeiro, onde mora, às 6 horas da manhã para estar em São Paulo no horário – isso tudo sem reclamar uma única vez de cansaço. Entrou na locação com um sorriso aberto, vestindo suéter amarelo, botas vermelhas e óculos de aro grosso. Foi direto para a cozinha, onde tomou uma caneca de café bem cheia enquanto mostrava no celular fotos da pequena Anna Izabel, 1 ano, que tinha deixado no berço e só veria à noite. “Faz parte. Sempre fui uma pessoa que vai à luta, trabalha, tem disposição”, justifica.
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A energia de Carolina contagia e é necessária para manter a rotina que ela vem levando desde o começo das gravações de Haja Coração, novela das 7 da Globo. A atriz dá vida a Penélope, mulher recém-separada e com problemas financeiros que conta com a ajuda das duas melhores amigas, Rebeca (Malu Mader) e Leonora (Ellen Roche), para se reerguer. “Às vezes, acabamos a cena e gargalhamos. Até perguntamos para o diretor se passamos do limite de tão fluida e gostosa que é a comunhão das três”, diz. Ela logo derruba boatos de que Ellen Roche estaria sendo inferiorizada nos bastidores. “Ficam inventando essas coisas porque ela é linda e muito talentosa. Acho que nós, mulheres, principalmente, deveríamos ser mais generosas umas com as outras”, defende.
Carolina, como ela mesma afirma, joga no time feminino, e essa sensibilidade aumenta sua revolta diante de tantas situações de preconceito: “O caso do estupro coletivo chocou todo mundo, mas a realidade é que isso deve acontecer com frequência e nem ficamos sabendo. Vivemos em um país machista, e o mais constrangedor é a impunidade pungente”. Ela acredita que a única maneira de mudar a sociedade em que vivemos é educar as crianças para que o futuro seja melhor. “Vivo repetindo para as pessoas próximas: ‘Crie meninos para serem os homens com quem você gostaria de conviver’.”
NA PRÁTICA
Ela afirma que faz sua parte em casa com Izabel e Valentina, a primogênita de 21 anos. “Quem mudou fui eu, graças a Deus. Precisamos evoluir, né?”, responde, rindo, sobre o que adaptou na criação das meninas, que têm 20 anos de diferença. “Na minha primeira gravidez, fiz um enxoval enorme e nem consegui usar tudo. Dessa vez, fui à loja e falei: ‘Me dá dois desse, um daquele e acabou’.” Para Carolina, a maternidade é a oportunidade de a mulher amadurecer em relação à culpa. “Claro que dá vontade de ficar uma hora a mais junto, brincar, mas tem o trabalho, marido, amigos, vontade de cuidar de você mesma”, explica, mostrando novamente seu lado pé no chão. Ela garante que não dá ouvidos às críticas e pitacos. “Se tem uma coisa que a maternidade me trouxe é a segurança de saber quem eu sou, de ter minha identidade para além do que os outros esperam de mim”, diz.
Desde 2010, Valentina, filha do empresário Mario Cohen, mora fora do país. Agora, está fazendo faculdade de economia nos Estados Unidos. As duas se veem a cada seis semanas. Às vezes Carolina vai, outras Valentina vem ou se encontram em algum lugar no meio do caminho. Nesse meio-tempo, Izabel ocupa os braços da mãe. “Eu beijo, mordo, aperto, belisco. Ela é deliciosa. Sorri para todo mundo na rua. O cara da padaria a conhece pelo nome, assim como os homens que trabalham na obra do metrô lá perto de casa”, revela. Mãe orgulhosa, conta que ela e o marido, o ator Marcelo Marins, 39 anos, dedicam quase todo o tempo livre para curtir a pequena. “Mas fazemos questão de ficar só os dois também. Não temos dia marcado nem nada, vamos só tocando a vida.”
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Quando se conheceram, há cinco anos, Marcelo, que é formado em medicina, já tinha criado coragem de deixar a clínica para trás e se dedicar às artes, sua verdadeira paixão. Ele canta, toca instrumentos, pinta, fotografa. Foi estudar na Casa das Artes de Laranjeiras e, a princípio, teve medo de dividir a novidade com Carolina. “Eu achava que seria difícil namorar um ator, porém, quando ele me contou, já estava apaixonada. Aí não tem jeito, né? A bravura dele só me fez admirá-lo ainda mais”, declara-se.
ENERGIA PURA
Não tem agenda cheia para Carolina Ferraz quando ela se encanta com um projeto. Ao estrear Receitas da Carolina, no GNT, em 2014, pretendia mostrar que cozinha não precisa ser um bicho de sete cabeças. “Quero que a vida das pessoas dê certo. Por isso, testo todas as receitas e simplifico”, conta, anunciando que volta ao ar com novos episódios em agosto. O mesmo comprometimento foi essencial para concluir o filme A Glória e a Graça, que chega aos cinemas ainda este ano. Ela se apaixonou pelo roteiro de Mikael Albuquerque quando o leu pela primeira vez, há nove anos, mas só em 2014 conseguiu um patrocinador.
“Narra a história do reencontro de duas irmãs após 15 anos de separação. Só que uma delas é travesti. Então, nos deparamos com muito preconceito pelo caminho”, relata. Em quase uma década, Carolina foi lapidando o personagem. Entrevistou mais de 63 pessoas entre travestis e transexuais, saiu às ruas junto com eles, vestida e caracterizada. “Queria fugir do estereótipo, construir uma pessoa real”, afirma. O mergulho foi tamanho que precisou se afastar por um tempo. O dinheiro não rolava e a frustração era grande. Há muita expectativa para o lançamento: “Quero ver a reação, modernizar a discussão, chamar as pessoas para abraçar as minorias”.
A energia de Carolina parece não ter fim. Quase chegando ao aeroporto, já no meio da tarde, ela ainda gesticula e fala com a mesma intensidade sobre todos os assuntos – da necessidade de se provar na carreira até a extensão de cílios. “Eu estou em uma fase boa, com a cabeça tranquila, pulsando. Quero viver coisas diferentes, abrir meu horizontes. Nada como um desafio para manter a vida andando”, conclui.