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O que a protagonista negra de Malhação denuncia sobre a falta de representatividade na TV

CLAUDIA propôs o debate e ouviu ativistas para saber o que elas têm a falar sobre isso

Por Isabella Marinelli
Atualizado em 22 out 2016, 19h21 - Publicado em 3 ago 2016, 13h00
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  • Em junho deste ano, noticiamos que a novela Malhação teria a primeira protagonista negra em 21 anos de história. Na ocasião, as redes sociais se dividiram entre os que comemoraram e os que disseram que a escalação já não era sem tempo.

    Agora, a sinopse da nova fase do folhetim foi divulgada. Segundo o jornal O Globo, Aline Dias interpretará Joana, uma moça que foge de casa e chega ao Rio para conhecer o pai biológico. No desenvolvimento da trama, consegue um  emprego como faxineira na academia Forma, que está entre os cenários principais da história.

    Talvez, os rumos da personagem não tivessem despertado a mesma reação do público, caso fosse um caso isolado. Porém, a escolha da profissão de Joana reacendeu o debate sobre a representatividade na televisão brasileira.

    Não é de agora que o empoderamento da mulher negra é deixado de lado. Qual foi a última vez que viu uma negra médica, advogada ou empresária na telinha? Nos últimos dez anos, isso aconteceu apenas duas vezes: em “Viver a Vida” (2009), quando Taís Araújo esteve na pele de uma modelo de sucesso – e primeira Helena negra de Manoel Carlos – e em “Cama da Gato”, quando Camila Pitanga incorporou uma superpoderosa diretora de marketing. São raros os roteiros que representam essa mulher em outras profissões.

    Recentemente, o jornal inglês The Guardian classificou a série Mister Brau como “uma atração sem precedentes no Brasil” por trazer um casal afrodescendente e milionário como protagonista. Afinal, apesar da maior parte da população ser miscigenada, “a televisão nacional ainda é dominada por brancos.”

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    Para discutir sobre a representação da mulher negra na teledramaturgia, ouvimos ativistas e entusiastas do movimento negro:

    Thainá Sagrado, ativista do movimento negro e autora do blog Themba.

    “Não fiquei feliz ao saber da protagonista. O sentimento foi: ‘só depois de 21 anos? Não estão fazendo mais que a obrigação deles!’. Cresci assistindo a essa novelinha e nunca nunca me vi ali. A notícia de que ela será uma faxineira me assusta, pois a gente percebe que não existe o desejo de se desconstruir. A mídia continua reforçando e contribuindo para a manutenção dos estereótipos da mulher negra.  A moça negra vai ser mais uma vez pobre e faxineira.

    Não existe problema algum em ser pobre ou faxineira! O problema é que as mulheres negras APENAS são escaladas para esses papéis. Parece que dizem: ‘Uma negra como protagonista de uma novela. Onde vamos colocá-la? Ah, sim, no lugar de sempre'”.

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    Bianca Santana, professora, mestre em educação e autora do livro “Quando me descobri negra”, levanta a mesma questão proposta por Thainá:

    “Sabemos que o fato das mulheres negras ocuparem somente determinados papéis reforça estereótipos. É como se o único papel que nos coubesse na sociedade fosse o de quem limpa ou tem o corpo usado para o sexo. Sabemos também que, historicamente, este foi o papel reservado para a mulher negra depois da escravidão. Faz sentido, portanto, em 2016, colocar uma protagonista negra que reforça estes papéis sociais?”

    Stephanie Ribeiro, estudante, escritora e ativista do feminismo negro:

    “As mulheres negras na televisão brasileira oscilam entre o papel da empregada, pobre esforçada, pobre interesseira e escravizada. São esses papéis em que mulheres maravilhosas, que são verdadeiras rainhas da atuação, como Zezé Motta, ainda estrelam. Lembro-me de como a protagonista Helena da Tais Araújo foi mal vista pelo público e, para mim, tem tudo a ver com o fato dela ser uma mulher bem sucedida e rica, mesmo negra. O público não está se acostumando. 

    No caso da Malhação, não me surpreende ela ser a faxineira, pobre e que não conhece o pai. Provavelmente, vai descobrir que o pai é rico, vai ter com rival uma patricinha e vai ficar lutando por um amor que supere as diferenças de classe e raça. A Aline Dias é linda, supertalentosa e fico feliz com essa chance de ser protagonista, mas esses roteiros óbvios cansam. É sempre a mesma coisa: apostas, disputas entre mulheres, diferenças de classe entre o casal principal, homens que mudam pelo amor. Na vida real, sabemos que isso não é uma verdade absoluta.

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    A questão é não precisamos só de mais personagens negros em papéis diversos: precisamos que essas lógicas racistas e machistas sejam quebradas de forma natural.

    Se já é difícil encontrar mulheres brancas dirigindo e escrevendo, imagina, então, negros e negras? Para mim, é o ponto-chave da questão. Não acho que esses papéis sejam entregues a elas porque não boas ou não estudaram teatro. Isso ocorre porque a lógica de quem pensa esses personagens ainda é perversa.”

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