Um dos sites mais respeitados no mundo do entretenimento, o Rotten Tomatoes, deu uma rara avaliação máxima – 100% – à produção original da Netflix “Dear White People” – ou “Cara Gente Branca”, em português. A nota é dada baseada em dezenas de críticas publicadas por profissionais em diversas publicações.
“Esperta, envolvente, com elenco excepcional, melhora a cada episódio”, diz uma das críticas. “É a série perfeita para jovens negociando um mundo em que as lutas por identidade se tornam mais complexas a cada dia”, diz outra.
Apenas para efeito de comparação, no mesmo site, a elogiada “13 Reasons Why” atingiu meros 85%. “House of Cards”, com trama adulta e complexa, que fala sobre política e atualidades, ganhou 84%. O que “Dear White People” tem de tão especial, então?
Para começar, ela é bastante diferente do que estamos acostumados a ver na TV. A trama se passa em uma conceituadíssima universidade norte-americana, como tantos filmes e séries. A diferença, aqui, é que o elenco é majoritariamente negro. Qual foi a última vez que você assistiu uma história com tantos negros estudando em uma universidade de elite? Pode parar para pensar o quanto quiser. Se lembrar, conte para a gente nos comentários.
Quando a série foi anunciada pela Netflix, recebeu uma verdadeira chuva de ataques de parte da audiência. Muitos usuários ameaçaram boicotar a Netflix devido à produção. Com frases racistas, acusavam a série de… racismo! Quando negros se juntam na cantina os brancos dizem que é autossegregação. Não importa que os brancos sempre se juntem, diz a personagem Sam White (Logan Browning) em dado momento da série. E essa é a lógica de quem atacou a série antes mesmo de assistir – não importa que milhares de filmes e séries tenham sido feitos com elenco branco – se uma série fala sobre negritude e tem elenco negro, é tachada de racista.
Bobagem. “Dear White People” não é uma série feita para detonar pessoas brancas. É, sim, uma série que coloca os negros em foco como poucas vezes vimos no mainstream. Fala sobre os dramas e problemas enfrentados por um grupo de estudantes de uma universidade de elite nos Estados Unidos. E além de falar dos dramas coletivos, destaca a individualidade de cada um. Questões íntimas e pessoais, conflitos internos, incoerências… enfim, humanidade.
Para quem é branco, nem sempre é confortável assistir, mesmo. Mas até por isso, é tão necessário! Em vários momentos da série quem assiste se identifica com as situações, e nem sempre de um jeito positivo. Reconhecer que é fácil se agarrar a estereótipos, ser preconceituoso e racista muitas vezes sem nem perceber é incômodo. Mas reconhecer os problemas é um primeiro passo fundamental para mudar o que incomoda. E “Dear White People” dá um belo empurrão para esse reconhecimento.
Quem é negro, identifica-se na pluralidade dos personagens retratados. A série mostra de modo bastante claro que não existe uma só maneira de ser negro, ou de militar contra o racismo, ou de se colocar no mundo. Cada personagem é muito bem desenvolvido na sua individualidade. E, assim como na vida real, ninguém é totalmente bom ou ruim. Todo mundo tem nuances. (E isso quem está falando não sou eu, autora branca desse texto, mas sim militantes e influenciadores negros como Nátaly Neri , Túlio Custódio e Gabriela Moura).
Se “Dear White People” é a série perfeita? Nesse caso, é uma questão de opinião. Mas negar a importância e qualidade da produção é fechar os olhos para a realidade e para como o mundo – ao menos no aspecto da representação dos negros no cinema e na TV – está mudando rapidamente para melhor. Seja qual for sua raça, se tiver a oportunidade, assista à série de coração aberto e tire suas próprias conclusões.