Ao voltar de um dia de trabalho – ela vinha fazendo bicos de limpeza de pisos –, a dona de casa Mariene Lima de Souza sentiu muitas dores logo abaixo dos seios e resolveu descansar um pouco. Como a dor não passava, pediu para uma amiga levá-la ao pronto-socorro. Depois de um exame inicial, o médico que a atendeu pediu um exame e falou que queria “tirar uma dúvida”. Com o resultado em mãos, a dúvida foi tirada: ela estava grávida.
“Fiquei em choque. Eu não estava namorando ninguém, fazia muito tempo que não fazia sexo, e estava grávida? Falei que não era possível, mas ele me mostrou o resultado e disse que as dores eram, na verdade, contrações do trabalho de parto”, lembra. Isaac, hoje com dois anos, nasceu na mesma madrugada, de parto normal. “Não tinha nada para ele, uma roupinha, nada. Eu não acreditava que aquilo estava acontecendo comigo”.
“Eu estava tomando pílula, achava que fosse impossível engravidar”
A advogada Luiza Bastos pelo menos teve um mês para se preparar para o nascimento do bebê. Durante sua corrida matinal diária, ela sentiu uma dor forte em um ponto “esquisito” da barriga. “Achei que fosse só uma dor de esforço, mas no trabalho passei muito mal quando tomei café. Meu chefe me deu o dia de folga e ainda brincou que era capaz de eu estar grávida. Ri muito. Eu estava tomando pílula, achava que fosse impossível engravidar”, conta.
A brincadeira do chefe se confirmou à tarde, quando ela decidiu checar no hospital o que eram aquelas dores. Assim que a médica da triagem apalpou a barriga de Luiza no local da dor, falou, sem rodeios, que ali havia um bebê. O exame de sangue indicou uma gestação de aproximadamente 35 semanas – um bebê é considerado pronto para nascer na 38ª semana.
Adriana nasceu de 39 semanas, por meio de uma cesárea, e agora tem dois meses de vida. “Fizemos um chá de bebê express, conseguimos montar um enxovalzinho. Mas meu marido precisou comprar uma banheira com trocador às pressas, porque a que compramos pela internet não chegou a tempo”.
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Mas elas não sentiram os sintomas de gravidez?
Tanto Mariene quanto Luiza garantem não ter sentido nenhum dos principais sintomas de gravidez – como enjoos, tonturas, aumento dos seios – ao longo de todos aqueles meses. Para a ginecologista e obstetra Lilian de Paiva Rodrigues, da Comissão de Assistência Pré-Natal da Febrasgo (Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia), existem duas possibilidades: ou elas realmente não tiveram nada ou tiveram e não perceberam.
“A maioria das mulheres enjoa na gravidez, algumas de forma bem grave, mas outras não sentem isso. E tem aquelas que, por causa de alguma intolerância alimentar ou uma questão qualquer de saúde, sentem enjoos regularmente, então não dão importância ao enjoo que indicaria a gestação”, afirma.
Também é preciso considerar o aspecto psicológico, segundo a médica: se a mulher não está tentando engravidar e está usando algum anticoncepcional, por que associaria qualquer sintoma a uma gestação? “Todas terão inchaço nos seios e aréolas escurecidas, só que, como gravidez não faz parte das coisas em que ela pensa, não existirá essa percepção do próprio corpo”.
E a menstruação? É possível menstruar durante a gravidez?
Não, não é possível ter ciclo menstrual ao longo de uma gestação, por mais que algumas mulheres digam que menstruaram normalmente – caso de Luiza.
“Esses sangramentos não são menstruação. Eles podem ser relacionados a pequenas intercorrências da gravidez, a um descolamento da placenta”, explica o ginecologista e obstetra Ricardo Luba, membro da Febrasgo e da AAGL (American Association of Gynecologic Laparoscopists). “Se a mulher soubesse que estava grávida, iria investigar o sangramento, seria afastada do trabalho para repouso, para preservar o bebê. Quando não sabe, acha que não é nada anormal e segue a vida”.
Além disso, Lilian e Ricardo esclarecem que os padrões menstruais variam muito de mulher para mulher. Tem as que não menstruam nunca, seja por usar um anticoncepcional hormonal que suspenda os ciclos ou por causa de alguma doença que os impeça, como a síndrome do ovário policístico. “Se o anticoncepcional falha, ela continua não menstruando e pronto. Nem tem o que perceber”, diz Lilian.
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Outras têm menstruações superirregulares – caso de Mariene –, então nem se dão conta de que os meses estão passando sem nenhum sangramento. Quando a vida é corrida demais, isso pode passar despercebido mesmo.
Gente, e é possível estar grávida e não ter barriga de gestante?
Não existe fórmula matemática para definir o formato de uma barriga de gravidez. Ela pode ser grande, pequena, redonda, pontuda, alta, baixa e mesmo quase imperceptível. Tudo depende do tipo físico da mulher e da posição do bebê no útero.
Lilian é categórica quanto ao fato de que ALGUM volume extra na barriga haverá, mas explica que se o bebê estiver na transversal (atravessado como se estivesse deitado, em vez de encaixadinho), por exemplo, a barriga pode ficar mais para os lados, dificultando que ela seja notada. É o que provavelmente aconteceu com a advogada Luiza, que creditou o volume abdominal a… gases. “Cortei refrigerante e água com gás, tomei um monte de chás diuréticos, mas só desinchei mesmo quando a Adriana nasceu”, diverte-se.
A ginecologista e obstetra ressalta, ainda, que muitas mulheres, por não terem a barriga “malhada”, não associam o aumento abdominal a uma gravidez e pensam que deram uma engordadinha ou estão com “barriga de chope”. Afinal, quem nunca ficou com uma pancinha de excessos, né, migas?
A vida normal quando não se sabe da gravidez pode trazer algum prejuízo?
Luiza diz que a notícia da gravidez, apesar de inesperada, foi uma alegria para ela o marido. Mas confessa ter ficado muito preocupada com o fato de ter tomado pílulas anticoncepcionais por todos aqueles oito meses e por não ter feito o pré-natal. Mariene, obviamente, também não passou pelas consultas periódicas para ver o desenvolvimento do bebê.
Não há motivo para muita preocupação, segundo Ricardo Luba. “A pílula não causa nenhuma má formação cerebral ou física”, afirma o ginecologista e obstetra.
Quanto a não fazer o pré-natal, elas foram agraciadas com gestações sem intercorrências. “O pré-natal existe para que qualquer alteração da mãe ou do bebê seja detectada e tratada, para que a gravidez evolua de forma adequada e a mulher faça um parto da melhor maneira. As mulheres que são pegas de surpresa por uma gravidez avançada e estão com tudo certinho realmente têm sorte”, avalia Lilian.
Ricardo conta que cerca de 80% das gestações são de baixo risco, com pré-natal que acaba sendo apenas um acompanhamento. Estes casos com final feliz, portanto, se encaixam na maioria. “Apesar de nós, médicos, os bebês continuam nascendo e a humanidade segue”, finaliza.
E muita gente pensando que aquele programa “Eu não sabia que estava grávida”, do Discovery, fosse o maior exagero…