Maternidade tardia: os benefícios e riscos de ter filhos com 35+
Cada vez mais mulheres decidem ter filhos após os 35 anos, mas é preciso conhecer bem os dois lados desta moeda
Se criar filhos já é um desafio, mais difícil quando a vida ainda não está estabilizada, seja financeira ou emocionalmente. Não importa se os motivos são profissionais, ou porque não encontrou o parceiro ideal ou por querer colocar em prática outros projetos: o fato é que cada vez mais mulheres estão empurrando a decisão de engravidar e apostando na maternidade tardia – bem além dos 30 anos.
A verdade é que a vida mudou muito nas últimas décadas. “Não se pode negar que ter filhos mais tarde é uma realidade”, concorda Maria Rita de Souza Mesquita, médica, ginecologista e obstetra, secretária-geral da Associação de Obstetrícia e Ginecologia do Estado de São Paulo (Sogesp).
“Se compararmos uma mulher de 40 anos do início do século passado com uma de hoje a diferença é enorme. Antigamente, víamos a imagem de uma ‘matrona’, agora, são mulheres jovens e ‘saradas’”, observa a ginecologista e obstetra Rosiane Mattar, professora da Escola Paulista de Medicina e presidente da Comissão Nacional Especializada em Gestação de Alto Risco da Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo).
Sem a pressão de seguir o script das avós, de casar e ter filhos logo, há uma busca primeiro por se estabelecer na carreira e ter mais segurança financeira. “A decisão do melhor momento para ter filhos é do casal”, observa Rosiane Mattar. “Mas, às vezes, é da própria vida”, completa ela, lembrando que há várias situações que fogem do nosso controle.
Para Luisa Anunciada Azevedo, de 53 anos que tem uma filha de 14, Samara, a história foi: “Casei tarde, aos 37, e eu tinha uma vontade muito forte de ter filhos, formar uma família”, conta a gerente administrativa. Ao que Arlete Cavinatto Guerra, de 62 anos, faz coro: “Antes de me casar, aos 37, minha rotina era trabalhar muito, cuidar dos meus pais que estavam idosos, namorar e viajar”, diz a técnica em artes gráficas, aposentada, que foi mãe de Bruno, hoje aos 24 anos, quando tinha 38.
O único problema é que o melhor momento na vida da mulher pode não ser a melhor hora do ponto de vista do próprio corpo. Acima dos 35 anos, as condições biológicas para engravidar e gestar já não são as ideais. Alinhar todos os critérios materiais e emocionais pode deixar de fora da equação o fato que, para a natureza, essa faixa etária a maternidade é considerada tardia para a maternidade. “Cada célula sabe a idade que tem”, pondera Rosiane Mattar.
“Eu sentia uma cobrança das outras pessoas porque eu ainda não tinha filhos, se eu teria condições de acompanhar depois. Mas quis muito a gravidez, por isso me preparei, me cuidei e segui todas as recomendações [médicas]”, lembra Luisa.
E nesse ponto, os especialistas ouvidos por CLAUDIA são unânimes: a mulher pode ter filhos mais tarde mas, para minimizar chances de complicações, vale conhecer todos os riscos e cuidados envolvidos. Se essa for a opção, melhor se programar e se cercar de precauções para poder passar por uma gestação tardia da melhor forma possível. “Eu queria ter filhos até os 40, então me programei para tal. Fiz todos os exames, parei de fumar, cuidei da alimentação e sempre fiz atividade física”, conta Arlete.
Maternidade tardia = óvulos mais velhos
Ao contrário do homem, que produz espermatozoides constantemente, a mulher nasce com um estoque pronto de óvulos, que são liberados a cada ciclo menstrual durante a vida. Assim, uma mulher de 35 anos tem óvulos com uma idade de aproximadamente 35 anos e meio — considerando que eles se formam dentro do útero, ainda durante a gestação.
Se levarmos em conta que os melhores em termos de qualidade vão sendo disponibilizados antes, desde a primeiríssima menstruação lá no início da adolescência, significa que perto dos 40 essas células já estão envelhecidas ou podem não estar nas melhores condições. “A tendência é que a qualidade dos óvulos liberados nessa idade seja pior, aumentando o risco de aborto e a dificuldade de engravidar”, explica a ginecologista e obstetra Maria Rita Mesquita.
Óvulos mais velhos também têm mais chances de sofrer alterações durante a divisão dos cromossomos, causando alguma alteração genética no bebê, como a síndrome de Down. Esse risco aumenta progressivamente com a idade.
Nesse sentido, congelar óvulos antes dos 35 anos pode ser uma boa opção – como CLAUDIA já trouxe em reportagem. “É uma alternativa inteligente para poder programar melhor essa gravidez”, diz Álvaro Pigatto Ceschin, presidente da Associação Brasileira de Reprodução Assistida. Mesmo que a mulher engravide mais tarde — seja de forma natural ou assistida — o óvulo será mais jovem.
Doenças sob controle
Além disso, quanto mais o tempo passa, maior a chance da mulher desenvolver alguma doença, como hipertensão, problemas de tireoide, diabetes, entre tantas outras. E isso, com certeza, afeta a gestação. Daí que ela deve entrar na gravidez com qualquer problema preexistente bem controlado. “Se ela for saudável, com peso adequado, sem comorbidades, a tendência é ter uma gravidez com boa evolução”, diz Maria Rita Mesquita. “Mas, mesmo nas grávidas saudáveis, há um risco um pouco maior de desenvolver problemas como pressão alta e diabetes gestacional”, completa Álvaro Ceschin.
Por isso o ideal é procurar um médico antes de engravidar (aliás, em qualquer idade) para tratar qualquer doença, fazer exames, receber orientações inclusive sobre nutrição, tomar ácido fólico para prevenir defeitos do tubo neural no bebê, entre outras recomendações.
Ao engravidarem e darem à luz aos 38 anos, Luisa e Arlete não enfrentaram nenhuma complicação na gestação, nem ganharam muito peso — mas ambas tiveram primeiro uma história de aborto espontâneo.
E, embora uma grávida mais velha possa perfeitamente ter um parto normal, entrar em trabalho de parto pode ser uma tarefa mais difícil — ou um processo mais lento. Por isso, nessa faixa de idade, há maior índice de cesáreas. “Não tive dilatação”, conta Luisa. Arlete, por sua vez, aproveitou a proximidade com seu aniversário e programou a cesárea para esse mesmo dia.
E depois da gestação?
“A grande vantagem da maturidade é que eu tinha a vida toda organizada. Pude me preparar para viver intensamente a maternidade, cuidava de tudo, amamentei durante um ano, fazia papinha, curti cada momento. Não carrego culpas, não deixei de fazer nada do que queria. Hoje, minha filha e eu somos grandes companheiras, temos uma relação próxima e aberta. Ter filhos é algo transformador, é viver aquele amor incondicional, que se doa”, diz Luisa.
Arlete também se identifica. “Tive uma mãe maravilhosa e sempre quis ser uma mãe assim, me dedicar ao máximo. Por isso, acompanhei tudo, amamentei durante um ano, sempre fomos unidos e, hoje, meu filho é um grande amigo.”
Afinal, uma coisa não mudou em gerações: os receios, as dúvidas e as infinitas alegrias da maternidade são as mesmas, em qualquer idade.