De repente, os pais percebem que o filho está falando sozinho. Conversa, ri, brinca e até discute com alguém que só ele vê. Pode parecer estranho, mas o amigo imaginário é um fenômeno bastante comum – e não deve ser motivo de preocupação. Pelo contrário, sua presença é fundamental para o desenvolvimento infantil, segundo a psicóloga Sônia Maria Marcondes Licursi, diretora da Associação Brasileira de Psicopedagogia e uma das autoras do blog Conversando com Educação. Nesta entrevista exclusiva, ela explica quem é essa figura tão intrigante, seu papel na vida da criança e como os adultos devem agir.
Quem é o amigo imaginário?
É um personagem que nasce da criatividade da criança e da sua necessidade de preencher a realidade de forma acolhedora e segura. Ela tenta integrar experiências do cotidiano e torná-las acessíveis ao seu mundo e à realidade que não compreende e não consegue absorver. Com esse amigo, a criança fala das alegrias e tristezas, dos desejos e conquistas, projeta comportamentos e emoções – ele se torna uma extensão da criança, que oferece suporte, segurança e proteção emocional.
Em que faixa etária costuma aparecer?
Surge por volta dos 3 anos. Coincide com o desenvolvimento da linguagem oral e com o uso da imaginação. E geralmente se manifesta em situações que a criança considera ameaçadoras, como o nascimento de um irmão, a separação dos pais, a entrada na escola nova, a mudança de casa, uma doença na família ou a perda de alguém querido.
Toda criança tem amigo imaginário?
A maioria tem, mas não todas. E nem sempre o amigo imaginário está personalizado e tem um nome. Ele pode aparecer na figura de um objeto, por exemplo. Na brincadeira, uma boneca ou um super-herói podem cumprir esse papel, permitindo à criança desenvolver uma conversa interna.
Quanto tempo costuma durar essa relação?
O tempo necessário para a criança aprender a lidar com as angústias infantis e fortalecer o emocional. Dos 3 aos 5 anos, a imaginação está muito presente na vida infantil; é alimentada pelos contos de fadas e pelos super-heróis, o que contribui para o ato criativo. Nessa fase, ela vai usar o personagem como defesa e proteção, para se desculpar de situações embaraçosas. No entanto, à medida em que aprende a elaborar e expor sentimentos, a criança vai se sentindo mais segura. Com 7 anos, tende a se despedir do amigo imaginário, pois os amigos reais se mostram muito mais interessantes.
Como os pais devem lidar com a situação?
Devem respeitar as necessidades da criança e aproveitar para conhecê-la melhor. A relação com o amigo imaginário traz possibilidades ricas para começar uma boa conversa, descobrir as angústias infantis e oferecer acolhimento. É importante observar em que contexto o fenômeno se manifesta: se acontece no ambiente familiar, na escola ou em outro grupo social. E também analisar as emoções que são projetadas nas histórias. Se o relacionamento com o amigo imaginário revela situações agressivas e violentas, ou que tiram a criança do mundo real, é aconselhável consultar um psicólogo.